segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

...e ainda do outro lado.

Atendendo que boa parte das pessoas que estão a ler estas palavras parecem incapazes de entender que aquilo que é lido das opiniões do Ministro da Economia, ou do Primeiro-Ministro, relativas à ciência portuguesa são versões moderadas e, diria até educadas, daquilo que é a opinião da generalidade dos eleitores, deixem-me dar mais uma achega "deste lado". E desta vez sobre que argumentos que não me parecem correctos ouvidos de quem está à parte:

1. Emigração. Dizer que devemos tirar dinheiro aos filhos alunos regulares para dar aos filhos bons alunos não é argumento para defender bolsas. Se fossem os nossos filhos não estaríamos a tirar ao mais fraco para dar ao mais forte só para que o  mais forte não se vá embora. Todos os que emigram são um problema para nós e, por isso, devemos ter uma atitude mais igualitária e menos favorável aos mais fortes;

2. Valor da ciência. Ninguém questionou o valor da ciência. Aquilo que foi questionado foi o valor da VOSSA ciência. Argumentos a puxar Einstein ou Newton para a conversa seria interessante se algum deles estivesse entre vós. Não estando, sugiro que defendam a VOSSA ciência e não a ciência em geral que não foi afectada;

3. Empresários não ligam ao que fazemos.  Este é um péssimo argumento. Não só não é verdade, como é contraproducente. Se os empresários não querem aquilo que fazem, nem de borla, não me parece ser a melhor forma de convencer o eleitorado dos vossos méritos;

4.  Privados não contratam doutorados. Primeiro, não é verdade. Quem quiser visitar empresas com doutorados, inscreva-se nesta caixa de comentários. Segundo, o argumento para ter doutorados é dizer que ninguém lhes dá valor? A sério?

5. Investimento. Não usem o argumento do investimento quando o argumento contrário é que a vossa ciência não tem retorno. Dá-lhes razão;

6. Quantidade relativa. Usar as publicações é um péssimo argumento para quem produz 0.2 papers/FTE/ano como o estudo do Armando revelou aqui há uns tempos. Mesmo que venham dizer que isso converge com a UE é uma produtividade ridícula em qualquer enquadramento e não é de todo aceitável. Depois o Passos referiu "qualidade" e o Lima "realidade",  "quantidade" é um tiro ao lado;

7. Dizer que os outros estados que vão contratar os nossos. Estão a dizer que os nossos são nossos por uma questão de dinheiro. Não é grande elogio;

8. Estão a mercatilizar o conhecimento. Quem é que está a pedir dinheiro?

9. Superioridade intelectual. Chamar burro ao primeiro-ministro só porque tem um curso manhoso, e não um doutoramento, é mesmo o que vem nos compêndios. Primeiro, porque quem conheça ambas as "comunidades" sabe que é uma conversa de rôto e nú. Segundo, porque o primeiro-ministro tem dez doutorados melhores à distância de um estalar de dedos, a começar por vocês próprios. Terceiro, porque parece que estão com saudades do tempo em que o primeiro ministro era um doutor de Coimbra.  É horrível.

Já agora, se querem uma conversa a usar, que tal fazerem uma de duas coisas:

1. Terem a humildade de esclarecer porque carga de água a vossa investigação é importante, que esperam obter com ela, qual a importância que esperam que tenha no desenvolvimento de que arte e com que certeza dizem isso.

2. Perguntarem o que é os eleitos do povo querem dizer com "mudança". Dá jeito a quem quer cá estar no dia seguinte...

Mas são só sugestões. Podem perfeitamente continuar como estão e esperar que o povo seja solidário com a vossa causa...

24 comentários:

José Fontes disse...

Não tarda aí a próxima remodelação governamental, eleições a isso obrigam.
E o senhor Pires da Cruz trata a tempo de se pôr em muito boa posição na grelha de partida.
Um «cientista» prático é assim que procede.
Mas cuidado, já houve outros que fizeram figuras ainda mais tristes e continuam na apagada e vil tristeza dos empregozitos do dia-a-dia.

João Pires da Cruz disse...

Seria preso no dia seguinte, Fontes. Garanto-lhe que seria tal ministro que o meu próprio governo me mandaria prender...

Anónimo disse...

1.Emigração
Não está a ver bem a coisa. A política (não assumida) consiste em mandar a massa crítica embora. A questão (não colocada) consiste em saber se é isso que queremos. Os filhos fracos ou fortes, ganham certamente em viver num País com massa crítica (este ganho não é mensurável segundo os seus parâmetros, mas garanto-lhe que é um ganho). É isto que deve ser debatido.
2.Valor da Ciência
Já disse isto noutra ocasião... Para que possam haver Einsteins, tem de haver todo o tipo de cientistas, maus, medianos, razoáveis, competentes, génios. Os génios evoluem sobre os ombros de gigantes. Mas, a frase é algo incompleta. Os génios evoluem sobre os ombros de gigantes, de médios e de assim assim. Tudo é necessário, faz parte do processo. É por isso que essa coisa do «vossa» e da «ciência em geral» não tem pernas para andar como argumento. A separação da «boa» e «má» ciência não é algo que se faça como quem corta ervas daninhas. Já agora, quem decide a «boa» e a «má»? É o João Pires com os seus critérios?
3.Há muitos cientistas contratados por empresários. E eles tendencialmente gostam do desempenho.
4. Concordo. Não é verdade.
5.O seu problema é a definição de «retorno».
6.O que queria?? que se fosse do 8 (menos de 8) a 80 em dois dias? Por decreto de lei proposto por um qualquer Ministro da Economia?
7.Caramba, este ponto eu nem percebo.
8.É evidente que há uma questão de dinheiro e de filosofia envolvido. Quando ouvimos o Pires e o Passos, percebemos que também há aqui a questão do «retorno» para ser debatida. E, muito mais vasto, a questão da natureza da ciência. Se um morango é vermelho, podemos discutir se o queremos ou não. Agora, andar a dizer que, a partir de agora, queremos morangos azuis por serem óptimos para o desenvolvimento é que já parece estranho.
9. Lá vem a conversa. Responda superiormente ou inferiormente (intelectualmente falando), mas debata os temas. São os 8 primeiros.

João Pires da Cruz disse...

1. Massa crítica? Porquê? O que é que deixa de funcionar amanhã se fechar tudo hoje? Não posso simplesmente viver dos papers dos outros? Não são publicados nos mesmos sítios aos quais tenho acesso? Porque é que eu não pego no dinheiro que hoje dou aos melhores alunos para fazer dos piores melhores? Porque é que a emigração de uns deve ser um problema e dos outros não? Emigração é um péssimo argumento.

2. Os meus critérios? Os meus estão salvaguardados pelas minhas opções e respectivas contrapartidas. As nossos critérios são definidos como tudo aquilo que temos em comum, sufrágio livre, directo, secreto e universal para representação e respectiva delegação de poderes. Mudou entretanto?

3. Ora vê? E quer comparar o valor económico (ou "para a sociedade", já que há alguma dificuldade geral em entender o conceito de económico) desses com os outros?

4.

5. Não é um problema meu. É um problema nosso. Se estamos a tirar dinheiro aos pobres devemos estabelecer o que lhes estamos a trazer. "Conhecimento" ou "massa crítica" não é retorno.

6. Produzir papers, cuja utilidade é discutível, não depende da quantidade de anos para trás basta meter FTE's em cima.






José Fontes disse...

João Pires da Cruz:
Esclareça-me uma coisa, o que significa isto: «meter FTE's em cima»?
FTE é o acrónimo de: Full Time Equivalent.
As primeiras letras, portanto, pois aprendi que os acrónimos não pluralizam.
E o que significa 's?
' em inglês indica o possessivo: The dog's man
s é o quê?
Depois de ter ouvido na rádio uma jornalista dizer que as galinhas colocavam ovos ainda não perdi a esperança de ver um cientista utilitário, daqueles que produzem muitas patentes, escrever: cerveja's

João Pires da Cruz disse...

Notícia de última hora. Aqui neste post os acrónimos pluralizam por decisão executiva! Ou bem que me estou a fazer a ministro ou não...

José Fontes disse...

Pois, mas ministros com licenciaturas instantâneas já tivemos q.b.
Convém que ao meno’s o’s cientista's utilitário's saibam escrever o’s formulário's da's candidatura's à patenteação da's descoberta's da's cerveja’s feita's a partir do's subproduto’s do's petróleo’s.

João Pires da Cruz disse...

Sim, bons são professores de Coimbra! Desses é que eram bons, pelo menos até caírem da cadeira...

Anónimo disse...

1. "Emigração."
Que grande confusao! Eu nao ouvi ninguem defender que se deve fazer um maior esforco por manter os jovens cientistas e aspirantes a cientistas em Portugal do que qualquer outro jovem. Vamos tirar o exemplo dos filhos, que so serve para puxar a conversa para o lado emocional, que nao costuma ser amigo do lado racional, e assim nao vamos longe. Tendo em conta o valor do orcamento de estado para as bolsas FCT em 2013, de que maneira e que o esforco para manter estes jovens em Portugal era inibidor de qualquer outro esforco para atribuir oportunidades aos jovens em geral? E de que maneira e que passou a ser mais igualitario?

2. "Valor da ciência."
Estamos de acordo, acho que toda a gente percebeu que o que se estava a dizer era mal dos investigadores portugueses; o problema e a falta de base para sustentar a acusacao. Nao sejamos ingenuos, claramente o problema aqui nao foi esse, caso contrario teriam sido capazes de explicar o que e que achavam que estava a falhar, e qual e exactamente o plano para corrigir a direcao. O que se ouviu foram palavras ocas, dados pobres e descontextualizados, e um vazio no discurso geral dos elementos do governo que se pronunciaram. Explique-me voce a mim, que sou investigador mas nao em Portugal portanto nao me afecta de modo algum e nao poderei interpretar a sua opiniao como ofensiva (apesar de ter fortes colaboracoes com dois grupos de duas universidades portuguesas): voce acha que a investigacao em Portugal, tendo em conta a idade e o investimento bruto, e pobre?
Eu percebo que gostasse de ler mais argumentos baseados na ciencia que se faz em Portugal, eles andaram por ai nos jornais, em artigos de opiniao por varios professores que deram casos concretos sem citar nomes e areas concretas; mas se eu fosse tecer um comentario sobre a situacao, nao me ia por a debitar tudo o que se faz em Portugal nos jornais, nao so ia-me esquecer de alguem e ser injusto, como tambem nao vejo a necessidade de chegar tao longe para explicar porque e que isto foi uma pessima estrategia para a politica de I&D.

3. "Empresários não ligam ao que fazemos."
Bom, eu nao li nem ouvi ninguem a dizer isso, ou pelo menos nessas palavras, senao estaria de acordo consigo. De facto, ha muitos empresarios portugueses estao interessados na investigacao portuguesa desde que seja financiada pelo estado, e de preferencia se as universidades continuarem a pagar as patentes e estabelecerem acordos; ja meter os seus tostoes, mete-lhes confusao por nao poderem ter a certeza do resultado final. Ha tambem muitos, e posso ate dizer que conheco um caso que me e muito proximo por ser um familiar, que realmente querem investir, e gostavam de aproveitar a ciencia "gratuita" e ate de meter o seu dinheiro em projectos, mas simplesmente o ambiente economico esta demadiado complicado para eles conseguirem expandir o seu negocio e obter emprestimos ou financiamento para passar das boas intencoes aos actos; e evidentemente tambem havera os que nao querem saber, mas nao creio que possamos especular que sao a maioria.
Contudo, nunca se esquca que a ciencia vale por si so, pelo valor intelectual e cultural que acrescenta, que e uma fonte de motivacao para geracoes mais novas, e pela qualidade que acrescenta os professores das universidades, e estamos ambos de acordo que uma universidade melhor acrescenta potencial ao pais, certo?

Anónimo disse...

4. "Privados não contratam doutorados."
Pois nao, nao e verdade. Eu nao preciso de visitar essas empresas porque conheco quem la esteja e quem as tenha fundado. Mas sao poucas as empresas que contratam doutorados, e nao sera pelo desinteresse dos privados mas antes pela falta de doutorados em Portugal (sendo que e garantido que uma parte dos que se doutoram querem manter-se na investigacao, dentro ou fora do pais, e a parte que quer ir para as empresas e fundamental). Agora a sua segunda parte revela uma confusao terrivel, e quero acreditar que voce nao esta assim tao equivocado. O argumento, no seu devido contexto e citado como deve de ser, e que as empresas que tem maior numero de doutorados tem maior facilidade em colaborar directamente com projectos de investigacao, incluindo a implementacao pratica dos resultados, e a razao e obvia! Sao duas formas muito diferentes de trabalhar, duas linguagens distintas, e precisamos pessoas capazes de entender ambas para as coisas andarem para a frente. Nao vai ser capaz de me dar um exemplo de um pais, com poucos doutorados contratados e muita transferencia de tecnologia, porque na verdade nem existe.

5. "Investimento."
Ha investimentos a curto, medio e longo prazo. Olhe para a Coreia do Sul, e veja onde chegaram, tendo arrancado com o investimento no inicio dos anos 60! E claro que isto e um investimento, um investimento que ainda estava a amadurecer e por muito que o senhor nao queira reconhecer, deu frutos e criou uma comunidade cientifica onde nada se passava.

6. "Quantidade relativa."
Nao vejo o que vale o numero de publicacoes se nao tivermos em conta o factor de impacto. Como disse e muito bem, nao interessa mais a quantidade que a qualidade. Contudo, nao vai encontrar muitos exemplos de paises onde com tao pouco investimento se conseguiu subir tanto o factor de impacto medio da comunidade cientifica, portanto nao vejo a base para se assumir que os cientistas em Portugal tem uma produtividade ridicula. Nao me apercebi que alguem tenha defendido os resultados da I&D em Portugal com base no simples aumento do numero de publicacoes.

7. "Dizer que os outros estados que vão contratar os nossos."
Podemos manipular a conversa como quisermos, mas nao e isso que esta em causa. Se quiser colocar as coisas em modos tao simplistas e redutoras como faz, pergunte-se o seguinte: que sentido faria uma empresa recrutar e pagar formacao a uma serie de pessoas para as transformar em especialistas, e depois nao as empregar, nao por falta de fundos para salarios mas porque a nova direcao nao gostava da anterior, e deixar assim estas pessoas sairem para outras empresas com a formacao que receberam? Claro que as coisas nao sao tao simplistas como este exemplo ou a sua afirmacao, nao me vou alongar neste ponto, mas sugiro-lhe que medite um pouco sobre o que implica para nos o fluxo extremamente negativo de investigadores em Portugal.

Anónimo disse...

8. "Estão a mercatilizar o conhecimento."
Va la...entao? Caramba, eu acho que e facil de entender o que se quer dizer neste caso? Ou vai-me dizer que a sociedade nao se deve proteger contra a falta de educacao? Eu estou a levar o seu post a serio, mas caramba, aqui ja nao se esta a esforcar muito, isto ja e debitar por debitar.

9. "Superioridade intelectual."
Esta bem, estou de acordo com isso, mas nao vi muita gente a escrever nas entre-linhas dos artigos, ou das entrevistas ou do que quer que seja, qualquer tipo de insulto directo ou indirecto. Eu percebo os que o fizeram indirectamente, porque do ponto de vista emocional este corte cego e irreflectido ainda custa a aceitar. Mas bom, percebo a sua chamada de atencao agora nao me parece que tenha sido relevante ou recorrente. Por fim, chamar o Salazar ao barulho por causa do doutoramento, quase que parece implicar que quem for doutorado, como o Vitor Gaspar, o Nuno Crato, o Alvaro Santos Pereira, ou o Marcelo Rebelo de Sousa ou a Angela Merkel e etc por ai adiante, sao potenciais ditadores horriveis. Ha que saber colocar os factos no seu contexto historico e colocar os argumentos desligados de factores emocionais...

Para finalizar:

1. "Terem a humildade de esclarecer porque carga de água a vossa investigação é importante, (...)"
Em primeira instancia, eu nao estou a ver como e que voce espera que toda a comunidade lhe va explicar o que faz e porque e que isso e importante. Caramba!! Nunca mais acabavam as explicacoes, alem de que muitas areas sao dificeis de explicar a leigos.

2. "Perguntarem o que é os eleitos do povo querem dizer com "mudança". (...)"
Pois, a malta bem queria perceber e ja se perguntou muitas vezes qual e a ideia ao longo dos ultimos dias...mas as explicacoes teimam em nao vir pa, e quando vem sao desvios para por a malta toda uns contra os outros...

Anónimo disse...

"O que é que deixa de funcionar amanhã se fechar tudo hoje?"...errrr...as universidades (por exemplo), que passariam a ter professores de segunda categoria e a formar licenciados de terceira categoria...

João Pires da Cruz disse...

1. Se tira dinheiro por via de impostos para dar a alguém, está a reduzir o consumo produtivo de um lado para meter a riqueza noutro. A simples referência à emigração é exactamente isso.

2. Sob qualquer critério, sim. Mas estou aberto a que me demonstrem o contrário.

3. Eu ouvi.

4. Não existe segunda parte. É toda a mesma, são dois comentários sobre porque é um mau argumento e é sempre mau dizer que o valor do que fazemos não é reconhecido.

5. Exacto. Por isso se deve justificar o investimento para compor carteiras, não reclamar ser um investimento ao mesmo tempo que se comporta como uma despesa.

6. Não se tem feito outra coisa e sim, o número de papers é irrelevante porque ninguém é pago em papers ou citações. Muito menos em citações potenciais, certo?

7.Está a sugerir que se deixe de formar? Ou que a formação implica um esforço de manutenção adicional que é incomportável? Eu acho que se deve formar sim, depois quem quer ficar, fica. Como se diz, faz falta quem cá está e as universidades estão cheias de gente à procura de espaço.

8. Ninguém pode estar a pedir dinheiro por algo e simultaneamente acusar os outros de estarem a mercantilizar esse algo. Eu gosto das coisas francas, não acho que os cientistas devam ser pagos em conhecimento e, por isso, não gosto que se valorize nada em conhecimento. Sim, estamos todos a falar de dinheiro, qual é o problema?

9. Eu vi. E não precisa de ir muito longe. De qualquer forma, os governantes são eleitos pelo povo, o seu curriculo académico é irrelevante para mim, eles ultrapassaram todas as provas necessárias para exercer as funções. Mas eu estava a condenar esse argumento, não percebo porque o quer virar para mim...


1. Leigos? É exactamente aos leigos que devem ser explicadas. Os leigos são quem paga a festa. É dificil explicar? Tente explicar a um cientista que tem que saber vender aquilo que está a fazer e depois diga-me o que é mais difícil...

2. Aquilo que assisti foi a insultos, deduções sobre competência (curiosamente as pessoas da FCT são tão cientistas como os outros), reclamações sobre as políticas. Eu ouvi dois ministros a dizerem o que é pretendido, uma comunidade científica a chamar-lhes burros por isso, mais nada. É verdade que não ouvi mais que orientações estratégicas: não vai haver bolsas para empregar pessoas em coisas inúteis e vão passar a envolver empresas. Mas ainda não ouvi ninguém a perguntar o que é que isso implica, por isso não me admira a falta de resposta. Porque chamar burro aos outros e dizer que as orientações estratégicas não prestam, as respostas estão dadas automaticamente.


João Pires da Cruz disse...

Os professores que lá estão são de segunda categoria e as bolsas é que resolveriam isso? Chiça. você é demasiado radical...

Anónimo disse...

Bom, vejo que a sua resposta está carregada de desvios ao assunto e comentários sobre detalhes acessórios, pelo que deduzo que o senhor não está genuinamente interessado no debate, está antes interessado em mostrar que "os outros" estão errados (seja como for e pelo que for), e se estas discussões não servirem para todos refinarem as suas opiniões, então estamos a perder tempo, pelo que não vou perder mais tempo consigo. Não podemos estar sempre certos, a menos que tenhamos uma vida muito limitada, e baseando-me na sua resposta, o senhor não parece estar disposto a aceitar tal facto.

Deixo algumas pequenas notas para a sua reflexão, na esperança que de futuro adopte, em abono da honestidade intelectual, uma postura mais humilde e reflexiva sobre os argumentos e os contra-argumentos:

- não vale a pena responder de volta a um ponto específico, se não tiver uma resposta para dar. Torna-se frustrante para quem quer levar a discussão a sério (como eu, no caso).

- evite simplificar demasiado as questões; qualquer simplificação vai limitar a validade da resposta, e há um limite a partir do qual as respostas não fazem qualquer sentido

- procure falácias lógicas nos seus argumentos, pois essa é a melhor maneira de as evitar. Em particular, notei que no ponto 7, teve a habilidade de reformular a minha posição, bem explicita em todos os pontos da minha resposta, de forma a tornar esta no seu inverso, e criticou a posição que me atribui, evitando assim lidar com a crítica que lhe fiz. Se fossemos analisar profundamente o que aqui fez, descobríamos que se trata de uma combinação de diferentes tipos de falácias.

- fica registado, pelo ponto 8 da sua resposta, que o senhor não atribui valor ao conhecimento per se; talvez o tenha escrito de forma irreflectida, mas faria-lhe bem passar uns momentos a reflectir sobre a história da inovação tecnológica e da revolução industrial.

- Já que me dei ao trabalho de abordar directamente o ponto 7 e 8, acrescento-lhe sobre o ponto 9: vá lá ler outra vez o que escreveu no post original e o que eu respondi. Ninguém virou argumento nenhum contra si, apenas lhe quis mostrar que a chamada do Salazar ao barulho não fez qualquer sentido e foi absolutamente despropositada.

Anónimo disse...

- ficou também registado no ponto 1 (no segundo ponto 1), a arrogância com a qual olha para os cientistas. E apesar de se ter agarrado ao acessório para fugir ao essencial (dando uma resposta que me permitiria voltar a copiar a minha resposta original e entrando assim em loop), eu até deixo passar isso e dou-lhe um exemplo concreto das dificuldades que podem aparecer em certos tópicos: recuando ao passado, todos os físicos tinham absoluta noção da importância de entender estrutura do espaço e do tempo, e de entender a gravitação num contexto relativista (refiro-me à relatividade geral do Einstein), mas antes de sabermos que dependíamos desse conhecimento para pôr telemoveis e gps a funcionar, tudo o que se dissesse ao público geral sobre a importância deste tema sem ser o conhecimento per se, seria uma aldrabice. Do mesmo modo, todos os físicos tinham absoluta noção da importância de explorar experimentalmente a estrutura atómica, subatómica e elementar das partículas que constituem a matéria, mas até se descobrir o raio-x ou a radioterapia (e tantas tantas outras coisas que se seguiram anos mais tarde), nenhum físico poderia prever as suas aplicações, e tudo o que se dissesse ao público geral, incluíndo as aplicações médicas, seriam, até estas aparecerem, uma aldrabice. Do mesmo modo, todos os físicos tinham absoluta noção da importância de explorar fenómenos quânticos como a emissão expontânea de luz, mas foi só depois do laser aparecer que se entendeu o potencial enorme da descoberta que daí resultou. Tudo isto envolveu tanto passos, e trabalho, com uma direcção muito bem definida e com um resultado ou preto ou branco, como passas, e trabalho, com uma direcção vagamente definida e com um resultado imprevisível, e qualquer um desses passos foi fulcral para se chegar ao resultado final. Voltando ao presente, peguemos no exemplo da teoria de cordas; estou convencido que a teoria de cordas não é a explicação final do problema físico que pretende explicar, e contudo, nesse enorme esforço, já se obteve um resultado que se vai traduzir em possibilidades tecnológicas no campo da matéria condensada. Um especialista poderá explicar aos leigos o que é a teoria de cordas, o que pretende explicar, e o que trata a matéria condensada. Se o seu trabalho for algo como uma simulação estocástica de campos quânticos, poderá explicar a importância da contribuição desse trabalho. Dificilmente vai explicar a importância de estudar amplitudes de teorias de gauge massivas, ou integrabilidade e algebras de renormalização, porque para entender a contribuição destes estudos, seria preciso compreender o problema técnico. Isto é óbvio para quem quer discutir de boa fé.

- a humildade não tem de significar necessariamente subserviência, mas a arrogância estimula sempre a falta de auto-crítica e por consequência de médio prazo a ignorância. Concordarei consigo que houve muita arrogância em várias críticas ao governo (e mais uma vez, compreendo a arrogância pelo impacto emocional), mas não vamos justificar o nosso mau comportamento pelos outros.

-até uma eventual próxima, de preferência lendo um comentário seu mais rigoroso e genuíno, e já sem a vontade de provar aos outros que estão errados.

João Pires da Cruz disse...

Meu caro, as minhas sinceras desculpas se a minha resposta transmite algo que não queria transmitir, que parece ser o caso.

Mas há três pontos fundamentais em que todo o post que não estou a conseguir transmitir:
a. O dinheiro de que estamos a falar é dinheiro que é tirado ao consumo que tem efeitos reprodutivos;
b. As pessoas que estamos a alocar às atividades são pessoas que, já não falando do facto de serem aquelas que melhor desempenho tiveram na escola, poderiam estar a desempenhar outras atividades;
c. Quem gere os dinheiros públicos são pessoas nomeadas pelo dono do dinheiro que é o povo.

Tentando ser mais rigoroso, para quem gere estes tres pontos é irrelevante o stock do conhecimento. Eu tenho acesso a esse stock, não preciso financiar ninguém. E até posso financiar indiretamente esse stock por via de unidades de participação em instituições internacionais ou em fundos de unidades de participação. E, tendo uma maior diversificação, tenho menor risco. Não está em causa se o conhecimento tem valor económico. Aquilo que me deve ser justificado é se eu investir como tenho feito, tenho um retorno/risco melhor que se o fizesse em Londres ou não investindo de todo atendendo os custos de oportunidade que referi em a. e b.

O ponto c. justifica aquilo que entendeu como desvios. Quem tem que avaliar se o investimento cobre os custos de oportunidade não sou eu. Nem o meu caro. É que o dono do dinheiro colocou a decidir. E este vai fazer aquilo que acredita que o dono entende como positivo. Daí lhe dizer que argumentos que não traduzam conhecimento, papers, citações, impactos, etc. em valor económico são contraproducentes.

Tal como falar em cordas(esta até a mim me custa), matéria condensada, etc. Ninguém diz que explicar detalhes técnicos é fácil. Mas eu tenho que o fazer todos os dias. Todos. Porque esse ónus é meu, sou eu que quero vender a clientes que, em ultima análise, podem pegar no dinheiro do projecto e comprar um Ferrari. Se quiser mudar a palavra 'humildade' para a expressão 'assumir o ónus da prova', é mais correcto. E neste sentido, quem tem que o assumir é quem quer dinheiro. O governo tem um mandato do povo e, não sendo provado o valor, então tem a obrigação de não assumir os custos de oportunidade. Não se trata de arrogância, trata-se de dever.

Acredite que eu reconheço o valor da investigação, eu investi 5 anos para fazer um doc em Física teórica, mais de um terço dos resultados da minha empresa vão diretamente para I&D e quando pergunto a alguém 'para que serve?' o que está a fazer, em muitos casos consigo entender o valor que PODE ali estar. Mas, como disse muito bem no seu comentario anterior, eu consigo fazer o esforço de mapeamento entre as cordas e o valor económico porque investi eu na minha formação cientifica(a FCT e a ADI recusaram pagar-me as propinas porque sou gestor). Mas tenho mais de 20 anos de gestor, 10 deles do meu dinheiro. E investimento é carteira. Apesar de reconhecer o valor das cordas, tenho que geri-lo com a genética, com o horizonte temporal do retorno das simulações estocásticas do campo quântico e das simulações estocásticas dos campos eólicos. E que tem que fazer isso para o dinheiro do povo é o governo. Tem que escolher. E vai escolhemos aqueles que assumiram o ónus da prova.

Termino, reforçando as minhas desculpas, não foi de todo intencional. Mas levo com tanto insulto que também acabo por responder torto a quem não merece.

Carlos Ricardo Soares disse...

Suponho que o João explica e justifica, tanto quanto é necessário, a relação que existe entre o “dinheiro” e o “preço do dinheiro” e entre a “importância do dinheiro” e o “mercado do dinheiro”.
Gerir dinheiro e produzir ou reproduzir dinheiro é uma ciência e uma arte.
Espantar-me-ia se me dissessem que as maiores inteligências gravitam em torno desse astro, uma vez que encandeia quem o vê e priva da vida os outros.
Mas do ponto de vista da ciência e da arte, nada a opor, é uma ciência e uma arte com o valor das ciências e das artes.
Só que, a ciência e a arte e o dinheiro, não valem por si mesmos, senão pelo que representam ou possibilitam. Nesse aspeto o dinheiro, pela fungibilidade, é o bem de liquidez por excelência.
Dentro da lógica fechada do “dinheiro gera/pode gerar dinheiro” e de que tudo o que gera dinheiro é bom, o investidor privado não tem muito por onde escolher. Os custos de oportunidade equacionam-se sempre em função de uma rentabilidade, mais ou menos imediata, sem consideração, por ex., por externalidades negativas.

Carlos Ricardo Soares disse...

Na minha perspetiva, o nosso tempo está a produzir a inteligência necessária e urgente (e obrigatória) para organizar e gerir o mundo enquanto planeta que está em perigo, por culpa dos humanos (e mesmo que o não fosse).
Vamos ter que ser muito claros e entendidos sobre aquilo que queremos, não enquanto investidor privado, mas enquanto coletividade, não enquanto EUA, mas enquanto Comunidade Mundial de países.
A questão do “valor económico” vai ter de prevalecer sobre a lógica do retorno do investimento e do lucro. E isso só será possível se se pré-ordenarem os fins do privado aos fins do público.
Gerir o privado e gerir o público são realidades e problemáticas diferentes, senão antagónicas.
A justificação dos fins pelos meios, no privado, é uma coisa, no público, é outra, completamente diferente.
No privado, o lucro “justifica” que me vendam três sacarrolhas mesmo que eu não use.
No público, não existe justificação para que alguém compre algo de que não precisa. Mas todos conhecemos muitos exemplos bem mais eloquentes do que este, como o do homem que compra vinte ferraris com o único objetivo de os destruir.
Para o privado, a ciência, a educação, a religião e a arte são mercadorias. Tudo o que possa gerar dinheiro.
Para o público, o dinheiro começa por ser o maior problema, porque os fins não são o dinheiro. Qualquer política que, por equívoco ou não, não pressuponha claramente que os fins do Estado não são o retorno, será desastrosa para todos.

Carlos Ricardo Soares disse...

Ao Estado compete, ao contrário dos privados, promover o bem estar, o desenvolvimento, a saúde, a educação, a paz, a justiça, o ambiente saudável.
Ao investir em ciência e tecnologia o Estado, em teoria, é a entidade que não pode deixar de agir com inteligência, sob pena de não obstar ao descalabro para que nos encaminhamos.
Nenhum investidor privado tem a obrigação de se preocupar, por exemplo, com o facto de o retorno do seu investimento ser ilegítimo, ou resultado de um efeito desastroso para a economia (por ex., numa perspetiva de consumismo destrutivo).
Infelizmente, para a população em geral, os partidos que “conquistam” o Estado fazem-no sem uma visão para o papel e as funções do Estado num mundo que tem de ser gerido e partilhado coletivamente, com ciência, economia, consciência, justiça e não, como até aqui, ao sabor da ambição, aventureirismo e poder de espada da cada um.

João Pires da Cruz disse...

E pedir desculpas pelo português que agora que leio, a porcaria do computador muda uma carrada de palavras...

João Pires da Cruz disse...

Carlos, vou tentar responder um comentario de cada vez porque cada um tem muito para dizer.
Argumentar pelo valor abstrato das ciências ou das artes serve para os dois lados. Para o lado de quem paga e para o lado de quem recebe. Se vale, não deveria ser preciso dinheiro para acontecer. Certo?
Passada a questão retórica, se eu lhe tiro o euro que ia gastar no café para o que quer que seja, estou a decidir pelo despedimento do empregado do café. E pela redução salarial do tipo do talho onde o empregado do café compra a carne. E assim sucessivamente até o efeito do euro se dissipar na cadeia. Por isso, quando volto a colocar o euro na economia, em bolsas por exemplo, devo ter em atenção se o valor do trabalho produzido vai servir ao bolseiro e, ainda, gerar o suficiente para o homem do café.
Isto não é um mero exercício (espero) para quem tem o dever de gerir a coisa publica. O valor das artes ou das ciências não é infinito, nem é todo igual. Tem que ser gerido e gerido de forma a que o mais fraco, o homem do café não saia prejudicado na história.

João Pires da Cruz disse...

Relativamente à sua ideia de público e privado, discordo completamente. O público não passa de um conjunto de privados. Na realidade a única coisa pública é imaterial e são os objectivos. Tudo o que é material relacionado com esses objectivos são privados. Os contribuintes são privados, os bolseiros são privados. E sim, todos eles procuram maximizar os seus recursos.

Isto para dizer que não há nenhuma diferença entre a gestão do bem privado e do bem público. Quer no público, quer no privado, não existe justificação para comprar algo que não precise. O que rebenta com 20 Ferraris é um estúpido que ficou sem 20 Ferraris e que vai à falência em breve se repete a brincadeira. Um estado que rebente com 20 Ferraris, significa que pode contar com mais uma centena de desempregados daí a uns tempos.

Finalmente, os fins do estado são retorno económico, ou é dinheiro no presente, ou é dinheiro no futuro. Nem que esse dinheiro futuro resulte da salvação do planeta.

João Pires da Cruz disse...

Mantenho a minha discordância relativamente ao papel público ou privado. Os privados têm um papel social validado pelo dinheiro que recebem de pessoas que o cedem livremente. Os bancos canalizam dinheiro de onde existe para onde é necessário. Os supermercados trazem comida de onde é produzida para onde é consumida, etc. A legitimidade do retorno do investimento é o primeiro suporte do negócio.

Finalmente, eu sou da opinião que o mundo está cada vez mais a a ser gerido e partilhado colectivamente. A falência dos estados europeus mostra isso. A perda do seu valor e a importância do agregado europeu é um passo importantíssimo e a previsível junção dos USA a este aglomerado mostra que os estados estão a desaparecer e a ser trocados por entidades mais globais. E isso são boas notícias para o planeta.

NOVA ATLÂNTIDA

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