terça-feira, 23 de julho de 2013

Os átrios-museus

Deve haver uma explicação perfeitamente razoável para o que vou escrever de seguida, mas não faço ideia qual seja. Apesar de ter falado com várias pessoas a propósito, o que encontrei foi um encolher de ombros ou conjecturas desgarradas.

Imagem retirada daqui
Ora bem, quando vou a escolas que conheço há muito tempo, dirijo-me à porta, àquela que tinha na memória, vejo-a fechada e o átrio deserto e percebo que já não se entra por ali: entra-se mais adiante, lateralmente, ou nas traseiras.

Há escolas cuja porta deita directamente para uma rua ou estrada com movimento e, compreensivelmente, a protecção dos alunos passa pela abertura de uma outra que garanta segurança. Não é esse o caso a que me refiro. O caso a que me refiro é de escolas, sobretudo de liceus e secundárias, que sofreram, num ataque de megalomania empresarial e governamental, obras mais ou menos radicais.

A deslocação da porta e do átrio é sintomática. Em geral, tinham a sua dignidade, sobretudo os átrios davam alguns "sinais exteriores de riqueza" acumulados ao longo dos anos: um bom móvel, trabalhos excepcionais de alunos, algum tapete tecido à mão, um quadro realmente pintado por alguém, um painel de azulejos, uma obra em ferro forjado, taças e medalhas ganhas em campeonatos, potes e pratos de faiança...

Por ali passavam alunos, professores, empregados, pais e visitantes. Passavam e percebiam que a entradas das escolas são como as entradas das casas: sítios que se preparam para dar a melhor imagem a quem chega...

Ao que sei, algumas escolas, poucas, fizeram finca-pé e mantiveram a sua entrada e para toda a gente, mas outras deixaram que ela fosse substituída por uma portaria estreita e deprimente, com alguém a controlar quem passa, ao lado uma parede lisa onde conta o nome em letras uniformemente fabricadas.

Na última escola onde estive, a minha, levaram-me, no final da visita, a ver, de dentro, como curiosidade, o átrio, por onde sempre entrei e saí como aluna. Estava quase igual ao que era, foi, aliás, o único sítio que reconheci, tudo o resto branco, asséptico, moderno, liso...

Mas estava deserta o átrio. "Acho que se pensa fazer aqui um museu", disse-me que me acompanhava...

7 comentários:

perhaps disse...

Interessante...A minha escola é actualmente um posto da GNR, não posso comparar. Também não visitei mais que duas a três escolas...não será suficiente para argumentar. Mas aquilo que conheço como portaria é um lugar de passar cartões, com um funcionário dentro de um casinhoto a controlar entradas.
O que a Helena refere como portaria conheço como átrio, entrada de professores e visitas - pelo menos foi por onde entrei. E corresponde. Tem mesmo o rosto de pretender ser rosto:)

E espero que se mantenha personalizado em cada escola. Mas, confesso, desconheço.

Helena Damião disse...

Perhaps
Sim, a palavra mais apropriada é átrio. Vou fazer algumas alterações no texto em função do seu comentário.
Muito obrigada,
MHD

Petrus Monte Real disse...

O que aconteceu em Viseu:
Na Emídio Navarro, frequentada pelo meu filho mais novo, fecharam o belíssimo átrio de entrada, que já existia há décadas; a entrada de alunos e pais passou a fazer-se por uma porta de vidro, bem afastada do local anterior. Todos ficaram a perder com a alteração.

Na Secundária Alves Martins (antigo liceu) fizeram umas obras que não encaixam no Edifício antigo e, no capítulo da qualidade, deixam muito a desejar; dizem-me que até passou a chover dentro das salas; e muito estranha foi a implantação de dois enormes muros de cimento, um de cada lado, que são um atentado ao estilo antigo e tapam completamente a visibilidade do Edifício: uma tristeza! Costumo chamar-lhes "Os Dois Muros da Vergonha"... só visto.
Não sei como foi possível tanta asneira... e ainda por cima a Parque Escolar contraiu (agora falo pela boca dos jornais) uma gigantesca dívida. É por esta e por outras que o país chegou onde chegou!
Muito haveria para dizer sobre o tema, mas, fico-me por aqui, em primeiro lugar para deixar de pensar neste assunto que só nos entristece; e, em segundo lugar, para não me tornar fastidioso.

Apenas uma nota final: creio que as obras do Liceu de Aveiro constituíram uma honrosa excepção... aí parece que houve mais respeito pela traça do antigo liceu [falo do aspecto exterior, obviamente, porque, na verdade, nunca lá entrei, mas passei várias vezes por lá enquanto decorriam as obras].
Muito grato pela partilha
Abraço
Celso José Costa

augusto kuettner de magalhaes disse...

Não parece que o átrio seja o mais importante, se todo o resto tiver a qualidade, que tantas vez nao tem.

O conteúdo e melhor que a fachada??? não???

Anónimo disse...

partilho da mesma opinião que a professora Helena Damião.

tudo é importante numa escola, incluindo o/s átrio/s. relativamente à pergunta colocada pelo «comentador» anterior: já pensou que, se calhar, a «fachada» reflecte também o conteúdo (ou melhor a ausência dele?).

não deixa de ser interessante verificar que nas escolas, que pessoalmente conheço, e que foram alvo de intervenção do Parque Escolar há um claro fechamento ao exterior, à comunidade... os edifícios escolares estão literalmente de «costas» para o exterior, quando, regra geral, o portão de entrada dava entrada directa para os pátios, átrios. não será que a concepção arquitectónica reflecte uma visão da escola cada vez mais afastada da comunidade, quando deveria ser exactamente o contrário?

algumas dessas escolas, por dentro, lembram-me, do ponto de vista arquitectónico, algumas penitenciárias... não estou a ironizar.

parabéns à professora helena damião, e também ao blog de rerum, pelas interessantes reflexões que nos propiciona.

cumprimentos,

luísa almeida, lisboa

José Batista disse...

Patilho inteira e completamente do que afirma Luísa Almeida.
O terceiro e quarto parágrafos do seu comentário são o retrato mais fiel que já vi acerca das escolas intervencionadas. E o que mais me entristece é que nos querem convencer de que aquela arquitectura é muito boa, que foi "uma festa" (sic), e foi mesmo..., pagamo-la agora!, tendo mesmo havido quem desse uma grande entrevista ao jornal "Público" afirmando que aquela arquitectura ia constituir um factor (supostamente importante) da aprendizagem. Enfim...

José Batista disse...

Vim reler e, claro, lá estão os erros.

Logo a abrir: Partilho e não "patilho".
Desculpas minhas.

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