segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

A BIODIVERSIDADE E O ECOSSISTEMA POLÍTICO


Texto da bióloga Helena Freitas saído no PÙBLICO:

Animada pelo recente aniversário de Charles Darwin (12 de Fevereiro), buscando na natureza uma interpretação racional de alguns comportamentos sociais ou societais, um exercício a que a biologia nos conduz facilmente, não me proponho escrever sobre biodiversidade, mas não resisto a elaborar sobre alguns argumentos que o estudo da diversidade biológica distingue, estabelecendo uma analogia que pode parecer provocadora, mas que não deixa de ter uma base racional sobre a qual vale a pena reflectir. Numa descrição muito genérica, entende-se por biodiversidade ou diversidade biológica, os milhões de plantas, animais e microrganismos, os genes que contêm e os ecossistemas que constroem. A sua importância é defendida por muitos, por razões variadas, prevalecendo os argumentos de natureza ecológica, que valorizam o papel da biodiversidade para o Homem e para as demais formas de vida. São também deste âmbito os argumentos de natureza estritamente funcional, admitindo-se que a biodiversidade é um garante do equilíbrio dos ecossistemas que suportam a vida tal como a conhecemos. Seja como for, a biodiversidade que hoje temos o privilégio de contemplar, e que nos faz justificadamente orgulhosos de um planeta abençoado, resulta de um processo evolutivo complexo e longo, tendo o Homem participado num dos seus mais recentes capítulos.

Um dos argumentos mais utilizados na defesa da biodiversidade, apoia-se na importância dos serviços prestados à humanidade pelos ecossistemas. Com efeito, os ecossistemas ou os habitats mais diversos, isto é, aqueles em que é maior a diversidade de espécies, são de forma geral os mais produtivos, entre muitas outras razões porque, ao reunirem distintas espécies, integram também distintas competências e capacidades que, no conjunto, favorecem uma melhor utilização dos recursos disponíveis, e desempenham melhor as tarefas colectivas, resultando daqui uma maior produção e um consequente benefício para o próprio ecossistema. Por outro lado, um maior número de espécies, permite responder às situações de instabilidade, ou à cadência cada vez mais imprevisível dos fenómenos biofísicos. Numa linguagem simples e sugestiva, podemos dizer que estão melhor preparados para as crises sistémicas, como aquela que vem vivendo a economia, porque a sua resiliência é maior. A diversidade de espécies corresponde a uma diversidade de atributos funcionais e suas respostas, sendo portanto mais sensato assegurar um nível de resiliência óptimo para cada tipologia de ecossistema. Dizemos, por isso, que a biodiversidade aumenta a resistência às doenças e a capacidade de adaptação a condições variáveis.

De destacar é também o papel comprovado da biodiversidade na prevenção e  controlo das espécies infestantes (apropriadamente chamadas espécies daninhas). Os dados que resultam da análise dos sistemas naturais, indicam claramente que os ecossistemas mais ricos em espécies são menos susceptíveis à invasão e proliferação de ervas daninhas. Numa analogia societal, a natureza ensina que a diversidade que podemos e devemos promover no ecossistema politico só pode ser favorável à promoção das boas práticas, à inclusão de novos valores, à eliminação das situações que nos indignam, ou à redundância das funções indesejadas, como a prevalência de elementos que contribuem para a perturbação excessiva ou corrupção deste ecossistema.

Analogia equivalente se pode estabelecer para os grupos funcionais, ou seja, entregar o exclusivo da interpretação da democracia a alguns grupos funcionais, em sentido figurado aos partidos, acabará sempre por diminuir as competências do ecossistema politico, uma vez que os grupos estabelecidos têm tendência a optimizar as características que lhe conferem o protagonismo individual, optando pela uniformização em detrimento da variabilidade, e pela competição em prejuízo da cooperação. O tímido mas consistente despertar da diversidade de pessoas e grupos a que assistimos na nossa democracia, pode ser encarado como um sinal de grande vitalidade e progresso do ecossistema político, incorporando novos valores e preparando os alicerces de uma ética global para os novos tempos.

Helena Freitas, in Público, 16.2.2013

2 comentários:

José Batista disse...

Tomáramos que assim fosse. E o pretexto não é mau para sugerir que seja. Se a democracia ignora os cidadãos ou funciona contra eles, como pode chamar-se democracia?
Por que não podem os cidadãos, sem dependência partidária, representar como deputados outros cidadãos que para tal os proponham e neles votem? Não sei se isso traria maior diversidade à ação política, mas aproximava as pessoas do exercício dela e do poder que politicamente se constitui.
Os partidos não podem (não deviam...) ser donos do poder. Não sou contra os partidos, mas interrogo-me: em que tipo de "escola(s)" se transformaram (algum)as "juventudes partidárias"?
Que líderes, que governantes e que pessoas, têm produzido?...
Onde está a raiz da palavra "democracia"?

E se a biologia nos revela a mais feroz e implacável das competições, também é verdade que nos mostra extraordinários (e comoventes) exemplos de cooperação.

Força, pois.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

De volta à grande e pequena(s). Pegada a nem rastro.

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