quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Já deu resultado!

Agradeço publicamente a resposta da Helena ao meu artigo sobre o fim do ensino. Mas não há qualquer argumento na sua resposta e há duas confusões. Para esclarecer o que está em causa é preciso pensar o seguinte: há um sentido em que nunca, na história da humanidade, deixou de haver professores. Pela simples razão de que todos temos de aprender tudo com os outros, e sozinhos, quando somos crianças. Professores informais, sempre os houve, e sempre os haverá, enquanto houver seres humanos como nós.

O que eu apresentei como ideia radical para ser discutida não é que os professores informais irão desaparecer: esses nunca poderão desaparecer. O que estava em causa não era sequer a ideia de desaparecerem os professores mais formais, mas antes o de desaparecer professores associados a um currículo rígido e largamente irrelevante para toda a gente, incluindo eles mesmos. Que é o que mais temos hoje. Qual é o professor de filosofia, química ou literatura que realmente valoriza o que é suposto ensinar? Quase nenhum. E qual é o aluno que valoriza, dois, três, dez anos depois, tudo aquilo que teve de decorar para enfiar nos exames? Quase nenhum. Então, que sentido faz tudo isto? Se não é uma mentira corporativa, para garantir um tacho aos professores, é o quê? Que bem se está fazendo à sociedade, aos alunos, aos pais dos alunos? Penso que a resposta só pode ser uma: rigorosamente nenhum.

Veja-se as experiências impressionantes de Sugata Mitra: crianças que aprendem inglês sozinhas, que nunca viram um computador e aprendem a navegar na Internet, crianças italianas que não falam a língua dele (inglês) e descobrem sozinhas o que ele estava perguntando e a resposta à pergunta. Isto é de tal modo impressionante que Arthur C. Clarke comentou: "Qualquer professor que possa ser substituído por uma máquina, deve sê-lo". A questão é: coisas profundas e complexas poderão ser ensinadas assim? O objecção é que neste tipo de auto-ensino só se ensina superficialidades e brincadeiras. Será? Convido-vos a ver o vídeo e já respondo a esta objecção.



A ideia de que o auto-ensino só serve para ensinar brincadeiras e trivialidades é falsa porque quase todas as pessoas mais criativas, que mais estudam e que mais escrevem aprenderam tudo por si próprias, sem professores: com livros e discussões entre pares. Mas se o ensino formal, disciplinarmente engessado e rígido, não serve nem para ensinar superficialidades que as crianças aprendem sozinhas se forem deixadas em paz, nem coisas profundas e complexas, serve para quê?

Portanto, a primeira confusão é esta: dizer que os professores formais, institucionais, vão acabar, é muito diferente de dizer que vai acabar o ensino e a aprendizagem. Pelo contrário, esta vai persistir porque sempre existiu e sempre existirá. Mas hoje o maior obstáculo à qualidade da aprendizagem são os professores formais, as escolas, as universidades e toda a institucionalização, burocratização e rigidez que isso implica. Os seres humanos sempre aprenderam e ensinaram, e fizeram-no suficientemente bem para chegarmos aqui sem nos extinguirmos.

A segunda confusão é que nunca, nunca, devemos esquecer que o ensino, mesmo o formal e institucionalizado, mesmo o ensino da escola e da universidade, não tem de ser financiado por dinheiros públicos. Afinal, os supermercados e as mercearias, sem os quais as pessoas não poderiam viver, são privados. E são bens de primeira necessidade: uma pessoa pode passar a vida toda sem ler um livro, mas não pode passar nem dois meses sem comer alguma coisa.

A ideia de que o ensino formal tem de ser financiado publicamente refuta-se de uma maneira muito simples. Só há duas hipóteses: ou esse ensino oferece algo que as pessoas valorizam e querem pagar, ou não.

1) Se sim, então não faz sentido ser público, porque nesse caso as escolas são como os supermercados: as pessoas valorizam, estão dispostas a pagar, e é crucial para elas. Mas o estado não financia tal coisa.

2) Se não, então não faz sentido ser público, pois nesse caso o estado está a usar o dinheiro das pessoas para financiar algo que não interessa às pessoas. Na verdade, interessa apenas a quem lucra com esse financiamento: os professores, funcionários, etc., que vivem como parasitas do dinheiro dos impostos das pessoas.

Evidentemente, a hipocrisia de quem defende o ensino financiado pelo estado é que toda a gente sabe que o ensino das escolas e universidades, financiado pelo estado, não é valorizado pelas pessoas e elas não estão dispostas a pagá-lo (daí que só contrariadas paguem 19 euros por um manual de filosofia, pois é algo que desprezam, ao passo que com todo o gosto dão 400 euros por um smartphone). Inventa-se então a ideia ridícula de que apesar de as pessoas não quererem a escola que temos nem com molho de tomate, lhes estamos a fazer um grande bem, obrigando-as a aceitá-la. Isto é uma falsidade, e uma falsidade hipócrita, que visa apenas servir os interesses de quem ganha com o sistema.

Concluindo, eu defendo duas ideias muito diferentes, e não devemos confundir uma com a outra. Primeiro: não precisamos de escolas nem de universidades estruturadas, formais, como temos hoje -- sejam financiadas com dinheiros públicos ou não. Sir Ken Robinson aponta aqui nessa direcção, argumentando que temos um modelo industrial de ensino e que precisamos de um modelo agrícola ou orgânico de ensino, que responda à diversidade de interesses dos alunos, em vez de obrigar toda a gente a estudar o mesmo da mesma maneira:



Um exemplo notável do que tenho em mente é a Universidade dos Pés Descalços. Bunker Roy faz um trabalho notável.  Os bem-pensantes consideram (sem dúvida, com boas intenções) que as chamadas pessoas ignorantes, iletradas, só podem ganhar dignidade social e pessoal estudando o que eles estudaram e ficando iguais a eles. Roy mostra que isto é falso. As pessoas podem ganhar dignidade desenvolvendo de maneira orgânica, e não industrial, os seus talentos e conhecimentos, aprendendo por si mesmos. Podem melhorar as suas próprias vidas, sem precisar das esmolas dos bem-pensantes -- que, curiosamente, nunca vão para as áreas mais pobres, para ensinar sem condições.



Esta é a minha primeira ideia: que há muitas maneiras diferentes de aprender e ensinar, e que o modelo industrial, em série, massificado, institucional, rígido e igual para todos, que temos hoje está estragado. Precisa de ser deitado fora. Precisamos de repensar tudo do zero. Precisamos de devolver dignidade ao bombeiro, de que falou Sir Ken Robinson, sem que ele tenha de estudar filosofia, lógica e literatura comparada (mas poderá estudar tudo isso, se quiser). Precisamos de ver, como Bunker Roy mostra, que a dignidade humana não precisa de graus académicos e escolares, e que isso é  na verdade uma forma encapotada de colonialismo, racismo ou snobismo.

A minha segunda ideia é que o ensino financiado pelo estado não faz sentido algum, quer tenhamos em mente as escolas de hoje, que foram concebidas como linhas de montagem industriais, quer tenhamos escolas orgânicas, como defende Sir Ken e como Bunker Roy efectivou. As duas ideias, apesar de relacionadas, são logicamente independentes. Isto significa que podemos aceitar a primeira, mas rejeitar a segunda, ou rejeitar a primeira, mas aceitar a segunda. Eu aceito as duas.

20 comentários:

António Manuel Dias disse...

"A ideia de que o ensino formal tem de ser financiado publicamente refuta-se de uma maneira muito simples. Só há duas hipóteses: ou esse ensino oferece algo que as pessoas valorizam e querem pagar, ou não."

Nem tudo o que as pessoas valorizam e não se importam de pagar está ao alcance de todos, ou sequer da maioria. Por exemplo, a saúde é algo que todos valorizamos e até estamos dispostos a pagar... enquanto conseguimos. Acontece o mesmo com a segurança. O estado serve, então, como uma forma de garantir a todos o acesso a esses serviços, distribuindo os seus custos por todos os cidadãos. Com a educação acontece o mesmo. É óbvio que o acesso à educação poderia ser totalmente privado mas o que isso significaria numa sociedade desigual como a nossa seria o aprofundar da desigualdade.

Assim, estou perfeitamente de acordo com a ideia de alteração completa do sistema educativo nos termos enunciados, porque este não serve a sociedade actual, mas não à sua privatização completa.

joão viegas disse...

Ola,

Não sou professor, mas...

Valorizei e continuo a valorizar os bons professores que tive, que foram muitos (na escola primaria, no colégio, no liceu, na universidade), assim como aquilo que me ensinaram e que eu, so muito dificilmente, poderia ter descoberto sem eles. Não imagino que eles me tivessem conseguido ensinar nada de jeito se não fossem, eles, os primeiros a valorizar as matérias que lecionavam.

Estou convencido de que o ensino obrigatorio e gratuito faz todo o sentido e estou completamente disposto a pagar impostos para que assim suceda. Eu e a esmagadora maioria das pessoas em idade de votar em quase todos os paises democraticos...

Saliento que também tive, ocasionalmente, professores mediocres, e pouco motivados, ou até completamente alheios à sua razão de ser, ao ponto de não a compreenderem.

Lamentei, mas sempre considerei que era o preço a pagar para um serviço que, globalmente, acho optimo, necessario, e que desejo que continue a existir muitos anos (nomadamente para as minhas filhas e para os seus descendentes).

O ensino pode - e deve - ser aperfeiçoado, em quantidade e em qualidade ? Claro que deve.

Eis uma modesta proposta concreta neste sentido, numa matéria que penso interessara ao autor do post :

Reforçar o ensino dos diversos ramos da ética nos programas de filosofia, nomeadamente por forma a ensinar de maneira mais aprofundada noções fundamentais sobre o que é o valor.

Com efeito, vejo por ai muitos professores de filosofia, mesmo entre os mais conceituados, que não fazem a mais palida ideia do que seja...


Abraços

AJFF disse...

Em que dados se baseia a resposta ("Quase nenhum") à questão ("Qual é o professor de filosofia, química ou literatura que realmente valoriza o que é suposto ensinar?")?

Jorge Branco disse...

ó Desidério,

vir com essas conversas liberais aqui em portugal não o vai levar a lado nenhum. esta gente odeia qualquer coisa que se assemelhe, por mais vagamente que seja, com liberdade individual e de escolha.

quando lhe atirarem uma pedra à tola e gritarem "ultraliberal" vai perceber no buraco em que se meteu.

eles querem é obrigar toda a gente a seguir as politicas que os intelectuais nas suas torres de marfim indiquem, e se se puder taxar punitivamente os ricos pelo caminho, tanto melhor.

poder escolher onde põe os miúdos na escola, as disciplinas que podem ou não fazer e até poder afastar maus professores, é tudo de uma inqualificável afronta ao principio de igualdade pelo qual todos obsessionam.

nivelamento total! e se possivel, por baixo! que aqui somos todos humildes e detestamos essas manias das grandezas!

Desidério Murcho disse...

A privatização do ensino é perfeitamente compatível com subsídios dados aos mais carenciados para poderem pagá-lo. Afinal, não precisamos de privatizar os restaurantes e os supermercados para dar comida às pessoas mais carenciadas.

As pessoas poderiam receber subsídios directos para poder pagar os seus estudos. Ou, como fazem muitas universidades privadas noutros países, têm sempre um certo número de vagas para os mais carenciados, vagas gratuitas, porque são pagas com o dinheiro dos outros, que podem pagar.

Sempre que queremos ajudar os mais carenciados não devemos pensar que a melhor maneira de o fazer é recorrer aos impostos e a uma máquina burocrática pesadíssima. Na verdade, neste género de modelo, por cada euro que as pessoas pagam de imposto para ajudar os mais carenciados, estes só devem ver uns 10 cêntimos, porque o resto serve para alimentar uma imensa máquina burocrática pesada, ineficiente, corrupta, demagógica, elitista e parasita.

Desidério Murcho disse...

Uma experiência de mais de 10 anos como formador de professores do ensino secundário e de mais de 15 anos na vida académica. Como todas as experiências pessoais, não tem controlo científico: posso ter tido um azar do caraças e só conheci o pior da classe.

Desidério Murcho disse...

Há um aspecto curioso da irracionalidade humana. É este: uma pessoa defende que tudo deve ser branco. Outra objecta, dizendo que quem quer branco, tudo bem, quem não o quer, deve ter alternativas. E a primeira diz: ah, mas o branco para mim foi óptimo, tem de continuar a existir. Isto é de uma rematada tolice, pois a segunda não está a eliminar o branco.

Eu não estou a eliminar o ensino mais formal. No vídeo de Sir Ken, ele não defende que deve acabar o branco. Apenas defende, com razão, que o branco não interessa a muita gente. E têm todo o direito a isso.

Finalmente, por coincidência, acabo de escrever um capítulo sobre o valor, de um livro de filosofia desprezado neste blog por si e outros porque é demasiado caro. E mesmo que não fosse demasiado caro, quem vai lê-lo voluntariamente? Como autor de mais de uma dezena de livros, sei do que falo: a generalidade das pessoas está-se nas tintas para o que eu valorizo, e com muito mais facilidade gastam 50 euros por mês em chamadas de telemóvel para dizer trivialidades, do que 20 euros num livro. A diferença entre mim e os bem-pensantes é que não quero obrigar as pessoas a pagar os meus livros, gostem ou não deles. Acho que elas têm todo o direito de achar os meus livros uma tolice. Não quero que o estado lhes roube dinheiro para me pagar o trabalho que me dá gozo mas quase ninguém valoriza.

joão viegas disse...

Não ha irracionalidade nenhuma. Não defendo que o ensino obrigatorio foi bom apenas para mim. Defendo que é bom para todos e que todos ganham com a obrigação, imposta a todos, de aprender a ler, a escrever, a contar, noções basicas de historia, de geografia, ciências etc. Da mesma forma que defendo que é bom para todos haver um serviço nacional de saude e regras imperativas sobre prevenção médica ou sobre vacinas obrigatorias.

Saliento que o que é obrigatorio no ensino, é a acquisição das bases. Pouco importa que ela seja feita nas escolas publicas, nas escolas privadas, ou até em casa, para quem pode (julgo que isso é possivel em Portugal como no Brasil).

Mas, existindo a obrigação, considero que se justifica plenamente um sistema publico de ensino, gratuito, ao dispôr de todos, com professores pagos pelo Estado.

Quanto ao resto, não sei de que falas. Eu nunca disse que desprezava manual nenhum, muito menos um livro que não li. Se trata da questão do valor, interessa-me e procurarei lê-lo se o encontrar. Da me as referências, que eu depois digo-te a minha opinião sobre o que la vem escrito.

Em troca, posso recomendar-te o seguinte link, gratuitamente, onde encontraras a definição de "roubo", pois obviamente também tens as ideias um pouco baralhadas a este respeito (é no artigo 210) :

http://dre.pt/pdf1sdip/2007/09/17000/0618106258.PDF

Abraços filosoficos


Desidério Murcho disse...

Interessa-me tão pouco a repetição acéfala das ideias estatistas e de pendor fascista comuns neste blog como pouco me interessa um discurso igualmente neoliberal acéfalo. O problema está no acéfalo. O que quero é argumentos e ideias viçosas, em vez de palavras de ordem para gritar em manifs.

Desidério Murcho disse...

O que está em causa não é saber se o ensino deve ser obrigatório, mas antes se o ensino tal como está estruturado é bom para todos.

Se a verdade insofismável sobre o roubo se encontra em leis escritas na maior parte das vezes por pessoas corruptas e profundamente imorais, então nunca tiveram razão pessoas como Mill quando defendiam que, contra a lei, as mulheres deviam ter os mesmos direitos dos homens. Pensar pela nossa própria cabeça, apesar de dar trabalho, é em geral uma ideia melhor do que confiar cegamente em autoridades.

joão viegas disse...

Reconheço que Mill tinha razão quando defendia, contra a lei vigente na altura, a igualdade das mulheres e dos homens.

E' legitimo inferir dai que todas as ideias contrarias à ordem estabelecida são, por causa disso mesmo, racionalmente justificadas ?

Francamente, não me parece. De contrario, dado que as mulheres têm hoje os mesmos direitos do que os homens, teriamos de considerar racionalmente justificado que elas deixem de ter os mesmos direitos...

Abraço

António Manuel Dias disse...

Sim, podemos fazer isso, substituir a solidariedade por caridade. Não terão o meu voto.

Desidério Murcho disse...

É uma contradição nos termos defender a solidariedade imposta. Solidariedade imposta é coisa que não existe, tal como não existe amor imposto. Ou é livre, ou é uma mentira.

Uma sociedade não é solidária quando as pessoas que ajudam não têm alternativa a não ser ajudar, por meio dos seus impostos. Os políticos podem usar a palavra, mas esse é apenas mais um exemplo das mentiras comuns do discurso político. Solidariedade, só voluntária. Involuntária é como um metal de madeira. Não existe.

António Manuel Dias disse...

Concordo. Mas entre solidariedade imposta e caridade imposta, continuo a preferir a primeira. Com a primeira, os alunos estarão todos em pé de igualdade (no que diz respeito ao direito de frequentar a escola), enquanto que com a segunda, haverá os que estão por direito próprio e os que necessitam de ajuda, os que deverão ficar gratos por terem a hipóteses de frequentar aquele estabelecimento. É que o resultado é o mesmo -- todos vão à escola -- mas os meios para o conseguir são diferentes. Num método estás a contribuir para a sociedade em geral, tratando a educação como um direito de todos os cidadãos, enquanto que no outro estás a contribuir o mesmo mas apenas para um alguns cidadãos em particular. Aí a educação passa a ser vista como um privilégio.

A liberdade é muito bonita e concordo que esse modelo de auto-organização é o ideal -- é mesmo o ideal que persigo! Mas apenas quando todos partirem do mesmo ponto, apenas quando todos tiverem acesso a tudo.

Ildefonso Dias disse...

Professor Desidério Murcho;

Estes vídeos deviam ter assinalado a seguinte nota:
Atenção isto é humor.
E porque de humor se trata, sou até capaz de imaginar o Senhor Professor Desidério Murcho, nas mãos daquela avozinha de 70 anos, analfabeta, a colocar-lhe por exemplo um implante dentário, não me leve a mal, as pessoas sabem que isto é humor, já ri bastante com o vídeo, acredite...

Desidério Murcho disse...

A inferência não é que tudo o que está na lei está errado, mas antes que estar na lei não significa que esteja correcto.

Desidério Murcho disse...

Do facto de algumas profissões exigirem ensino muitíssimo estruturado não se segue que todas o exijam. Do facto de uma profissão exigir um ensino estruturado, não se segue também que é preciso impor a estrutura aos alunos, em vez de serem eles a procurá-la. Bill Gates ou Steve Jobs precisaram de uma formação altamente especializada para fazer o que fizeram -- mas nenhum tinha um curso superior, e ainda menos graus avançados.

Escreveu Kant em 1765: "as academias enviam para o mundo mais pessoas com as suas cabeças cheias de inanidades do que qualquer outra instituição pública."

joão viegas disse...

OK, aceito isso sem problema.

Não considero que o ensino obrigatorio e o serviço publico de educação (duas coisas distintas, embora interligadas) sejam bons porque estão previstos na lei. Considero que são bons porque são racionalmente justificados.

O ensino obrigatorio é racionalmente justificado porque é bom, para todos, que todos sejam obrigados a adquirir as bases (cf. o que eu escrevi acima). Não desenvolvo porque, se percebi bem, não pões isso em causa.

Havendo ensino obrigatorio, é racionalmente justificado que o Estado coloque ao alcance de todos os melhores meios possiveis para adquirir as bases que definem o ensino obrigatorio. (E, ja agora, também vejo méritos no facto de o Estado colocar ao alcance de todos meios para adquirir um bocadito mais, mas isso ja sera outro debate). Eis o proposito do serviço publico de educação...

Vamos talvez concordar com as duas (importantes) ressalvas que seguem :

- Havendo serviço publico educativo, é imperativo que este seja o melhor possivel ;

- Por mais que se faça para obter um ensino publico de qualidade, não é legitmo obrigar as pessoas a segui-lo em vez de outro sistema, que elas devem poder escolher livremente, desde que lhes permita adquirir as tais bases. Mas, como é obvio, as pessoas que escolhem outro sistema não podem reclamar que o custo seja suportado por todos (na pratica, ha soluções intermédias, mas adiante). E não devem ser dispensadas por causa disso de contribuir ao esforço de todos para financiar o serviço publico.

Boas

Stoudemire disse...

Estas ideias que o Desidério aqui defende já foram experimentadas noutros locais e noutras eras. Os resultados foram murchos.

Mas não há nada como experimentar. Deixar cada um a aprender por si e a escolher o que lhe apetece... acho ótimo. Eu, quando era aluno, teria limitado os meus estudos a Inglês, Português e História e marimbava-me para o resto. Curiosamente, hoje lamento não me ter interessado igualmente pela Matemática e pela Física e ter aprendido Latim e Grego mais cedo. Aliás, pensando bem, se a minha opção não tivesse contemplado o estudo (tardio) obrigatório de Latim e Grego, eu não teria estudado essas matérias. Assim sendo, como poderia eu saber que me interessava tanto se não tivesse contactado com elas? Como se pode amar o que se desconhece?

Unknown disse...

Bom... o meu irmão (estudante de Física) deu-me a conhecer este blog, e fê-lo, principalmente, para me mostrar os posts sobre o ensino que aqui se têm escrito. Sou docente, formada especificamente para o efeito, mas só segui esta via por paixão. E continuo a tê-la quando me permitem ensinar os meus alunos. Gostei muito de ler todas as opiniões e os posts em questão, ainda bem que há gente que pensa sobre o ensino, em oposição a debitar umas palavras que não formam uma opinião. Não concordo com muita coisa e concordo com muita. Em relação à obrigatoriedade do ensino, bastava visitar ao bairro social, de onde eram provenientes os meus alunos, para tentar implementar a ideia "só estudas se te interessares e pelo que te interessares". Ainda havia alguns que iriam de livre vontade estudar. E com grande sucesso. Mas muitos só descobrem a felicidade e/ou a utilidade de aprender quando eu, e os outros docentes, os "obrigamos" durante uns tempos a fazê-lo. O Ensino Básico, até ao 9.º, é absolutamente imprescindível, para que não se criem ainda mais desigualdades. Deve continuar nos mesmos moldes? Claro que não. Mas é por muita gente achar que os professores são parasitas que vivem à custa do dinheiro público que o ensino está cada vez pior. Turmas de 30 alunos, programas elaborados ao mais ínfimo pormenor que nós temos de debitar aos alunos, porque no fim do ciclo terão um exame que é igual para todos. Enfim... Tal como alguém disse acima, Saúde, Segurança e Educação devem ser providenciados pelo Estado a todos os cidadãos, correndo o risco de criar ainda mais desigualdade. Em relação ao facto de todos serem obrigados a aprender o mesmo: tem toda a razão. Os nossos governantes, principalmente os MEC pelos quais temos passado,adoram falar no modelo da Finlândia. E têm muita razão, pena não adotarem todo o modelo: pelo que estudei na faculdade, há um programa geral para todas as disciplinas. E, como todos os professores são profissionais altamente qualificados, decidem o que irão ensinar, decidem o que os alunos irão ler, o que irão discutir. Para mim, que sou de Português, seria um pedacinho de céu. Já para não falar nas várias opções que os alunos têm: umas gerais, outras profissionalizantes... mas profissionalizantes a sério, não são cá cursos CEF e PCA e coisinhas que só servem para depositar os alunos que não estão minimamente interessados na escola mas que têm de cumprir a escolaridade obrigatória. E agora poderá dizer-me: então se querem um ensino de verdadeira qualidade, vão para o privado. Mesmo com as pseudo bolsas (o que os privados querem é também ganhar o seu) uma ínfima percentagem da população teria acesso à qualidade. E voltamos à questão das desigualdades. Quanto à qualidade dos educadores em si... bom... isto é público é melhor não me pronunciar sobre a questão. Cumprimentos a todos e continuação de uma boa discussão.

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