sexta-feira, 27 de julho de 2012

OS DEUSES DO DARDO



Minha crónica no "Sol" de hoje::

Agora que estão a começar, em Londres, os XXX Olímpiadas da era moderna, surge nos media uma avalanche de dados sobre as várias modalidades: os atletas, as marcas, a história. Venho aumentá-la um bocadinho fornecendo alguns dados sobre o dardo.

Porquê o dardo? Trata-se de uma modalidade olímpica onde os recordes tiveram uma queda, em vez de terem sempre aumentado. O actual recorde mundial é de 98,48 m, obtido em 1986 pelo checo Jan Zelezný, um lançador fenomenal, detentor das cinco melhores marcas mundiais de sempre, mas o recorde mundial anterior era de 104,80 m, marca conseguida pelo alemão de Leste Uwe Hohn, o único atleta a lançar o dardo além de 100 m. O actual recorde olímpico, de posse do norueguês Andreas Thorkildsen (90,57 m, em 2008, nos Jogos de Pequim), o grande favorito para Londres, é também menor do que já foi. Como é isso possível? Acontece que em 1986 os regulamentos do dardo foram alterados: com a pulverização dos recordes, corria-se o risco de o dardo acertar nalgum espectador. Não se alterou nem a dimensão do dardo (para homens, entre 2,6 e 2,7 m) nem o seu peso (máximo de 800 gramas), mas deslocou-se o centro de gravidade escassos 4 cm mais para a frente. Essa simples mudança fez com que o dardo, em vez de planar no ar durante muito tempo, tivesse tendência para se inclinar, caindo mais cedo e mais virado para o solo. A física do movimento real do dardo é bem mais complexa do que a física dos projécteis que se aprende na escola secundária, mas os lançamentos feitos pelos melhores atletas podem ser simulados na perfeição com base nas leis de Newton. Assim, conseguimos, por exemplo, perceber porque é que eles, para obter os seus recordes, lançam o dardo com um ângulo de cerca de 40 graus relativamente à horizontal (o ângulo óptimo depende um pouco do vento).

Já nas Olimpíadas da era antiga, na Grécia, se praticava o lançamento do dardo, imitando certamente o arremesso pelos guerreiros de uma lança. Curioso é que os Lusitanos, que povoaram o território português na época dos Romanos, adoravam um deus, de seu nome Runesocesius, a quem atribuíam a posse de um dardo. Era o “deus do dardo”. Já não há deuses como antigamente. Mas atletas como Zelezný, Hohn  e Thorkildsen são os modernos deuses do dardo.

7 comentários:

João de Castro Nunes disse...

Maia longe, mais além, cortando o ar,
o lema deve ser do atirador
seja do dardo seja do que for
para a distância máxima alcançar!

JCN

Areia às Ondas disse...

Podia perguntar: Que ciência tem lançar uma 'seta gigante'? Pelos vistos tem muita. Que tinha história, já o sabia, mas estes pequenos/grandes pormenores são de elevado interesse pois mesclam uma 'coisa' aparentemente inócua no campo da ciência, com pensamento e mudança, enfim, com conhecimento.

João de Castro Nunes disse...

Segue para soneto, ao jeito meu:

Pobre de quem se fica para trás,
deixando-se vencer pelos demais
na luta pelos nobres ideais
por mais alto sonhar não ser capaz!

Na vida somos todos em geral
olímpicos atletas à procura
de obter um posto acima do normal.

Sempre mais longe, sempre mais além,
é desde logo o fito para quem
pretende não fazer triste figura!

JCN

João de Castro Nunes disse...

No fundo a vida consiste
em ver quem mais longe alcança
com seu dardo ou sua lança
e na luta mais resiste!

JCN

João de Castro Nunes disse...

O sucesso na existência,
em qualquer ramo que seja,
depende da competência
com que o dardo se maneja!

JCN

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Os ponteiros do relógio "são dardos" que apontam para fora: a distáncia nem existe.

cartesiano:penso logo existo

e fora do pensamento o que sou?!
nada!

o nada é tudo em ser espaço
existir em variáveis
dardo = vetor

movimento, realizacção, real acção.

Paulo Cabrita disse...

Ao contrário do que o autor insinua a razão de se ter alterado o centro de gravidade do dardo não foi porque "corria-se o risco de o dardo acertar nalgum espectador" mas antes diminuir o número de aterragens planas e não pela ponta, como deve ser. Antes de 1986 (nos homens) e 2000 (nas mulheres) era habitual verem-se muitos lançamentos anulados pelo facto de os dardos não aterrarem com a ponta mas sim deitados. Hoje é muito raro ver-se a tal bandeirinha levantada para indicar uma aterragem anulada. Como consequência de forçar uma melhor aterragem os lançamentos tornaram-se mais curtos. Ao que parece o autor não vê muito atletismo....

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