segunda-feira, 14 de maio de 2012

O Trabalho de Migrar – A Migração Espectacular do Beija-flor.


Crónica, na sequência de outra, as duas publicadas primeiro na imprensa regional.

Esquecemos muitas vezes o que nos parece óbvio!

Algumas coisas são tão próprias da nossa natureza, tão habituais e regulares, que não despendemos esforço para reparar nelas.

Todos os anos esperamos e achamos natural que muitas espécies de aves, como as andorinhas e outras pequenas aves como os beija-flores, ou colibris, regressem no início da estação da primavera.

A sua chegada, alegra-nos como prenúncio de um novo tempo de fertilidade, promessas de nova abundância de alimentos, de um clima mais ameno e contrário às agruras das estações frias. Mas de quão longe vêm essas aves que enchem o espaço com anúncios primaveris? Antes de continuar, façamos uma pausa, voltemos ao princípio.

No princípio esquecemo-nos de constatar o óbvio: antes de a vida desabrochar no planeta Terra já havia “tempo”, já havia “espaço”. A evolução da vida no planeta Terra efectuou-se sobre a matriz “física” do “tempo” e do “espaço”. E estes ficaram substantivos, elementos íntimos da vida. Ficaram incorporados nas características e propriedades do que é vivo num determinado período de tempo. Durante esse período de tempo, o ser vivo explorou e migrou num determinado espaço. Como as condições mais apropriadas “à sua vida” variavam no espaço e com o tempo, sobreviveram os grupos de indivíduos que melhor se adaptaram à variação frequente, cíclica, de determinados factores físicos e químicos, também eles variáveis no tempo e no espaço.

Assim, as migrações cíclicas ajustadas às estações climáticas são uma das características da vida neste planeta. Em todas as migrações dos seres vivos é possível encontrar algo de surpreendente que nos maravilha. O exemplo da migração das pequenas aves conhecidas por “beija-flores” (família Trochilidae) é um dos que surpreende pelo grande contraste entre o seu tamanho de poucos centímetros, alguns gramas de peso, e os milhares de quilómetros da sua migração sazonal à procura de flores e primavera.

Algumas espécies de beija-flores efectuam voos de cerca de 2400 km, sem nunca parar e sempre sobre o mar, para regressar às zonas em que a estação primaveril vai despontar. Para isso, estas pequenas aves mantêm uma velocidade de cerca de 40 km/h, durante cerca de 60 horas! Para “aguentar” a migração, estas aves alteram o seu metabolismo de reservas energéticas e armazenam uma significativa quantidade de gorduras na forma de ácidos gordos e cetonas, aumentando cerca de 10 vezes de peso e o dobro do tamanho! Uma transposição para o ser humano significaria um aumento de peso de cerca de 10 kg por dia, durante a preparação para o início da migração!

Um dos aspectos muito curiosos da bioenergética associada a esta migração é o de que água é produzida como um dos produtos da oxidação das gorduras (combustível) durante o voo. As pequenas aves não passam sede, nem fome, nem precisam de recorrer às proteínas dos seus necessários músculos para chegar ao seu destino.

No final da migração, o beija-flor consumiu cerca de dois terços da gordura armazenada, e ainda lhe “sobram” reservas de energia para alguma eventualidade, algum atraso na primavera, algum contra tempo do clima.

(contínua)

António Piedade

8 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Autênticos prodígios biológicos.

Um espanto. Uma beleza. Há quem lhes chame

maravilhas de Deus. Mas talvez sejam só da

natureza. Ou mais restritamente dos colibris.

Ou da nossa sensibilidade. Ou da pequenez do

nsso entendimento.

Ou...

E serão muitas as espécies de colibris que

chegam ao nosso país, em cada primavera?

E de onde provêm?

Caro António Piedade: Ocorreram-me estas

perguntas, mas não se incomode com a resposta.

Eu mesmo, se tivesse tempo, a devia procurar...

José Batista da Ascenção disse...

Olha, ali me ficou um erro. Já é costume. Peço desculpa.

Já me referiram terem sido avistados colibris em Portugal.

Nunca vi nenhum. Será que começaram a vir?

Anónimo disse...

Por ter lido ontem no Diário de Coimbra esta matéria, fiquei muito curiosa com a migração dos beija flor, e procurando na net algo sobre o assunto, eis-me chegada de novo aqui! Creio que vou vir aqui mais vezes!
Cumprimentos,

Isabel Vaio

Cláudia S. Tomazi disse...

Digníssimo professor José Batista da Ascenção, causa para poucos apreciar a natureza do colibri, e sinceramente acredito que vos surpreenderia se de algum dia pousado no ar, conclui-se marailhas de Deus.

José Batista da Ascenção disse...

Olá, Cláudia S. Tomazi

Sim, não é privilégio de todos apreciar ao vivo a maravilha dos

colibris.

Eu nunca o pude fazer.

Além do mais agora, em Portugal, passámos a ganhar ainda menos,

muito menos...

Mas não quero perder a esperança.

Nisso e noutras maravilhas de Deus.

Muito obrigado, pela sua sensibilidade.

Deixo-lhe um abraço.

Cláudia da Silva Tomazi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

No nosso quintal, em Paredes de Coura, há ceca de uma semana anda um colibri (talvez sejam dois, pois parecem ligeiramente diferentes) a visitar as lavandas. Conseguimos um pequeno filme. Podemos enviar-lhe.

Sayonara disse...

Encantada com esses pequenos seres alados. Aqui em meu jardim, aparecem com frequência para se deliciarem com as pequenas flores do manjericão... hoje um bem pequenino, pousou em um galho da orquídea e eu fiquei paralisada para não assustá-lo... ficamos imóveis por um tempo. Ele parecia inflar o peito e abrir as penas para receber um restinho de raio de Sol do final de tarde. depois, com a agilidade que lhe é própria, começou em um balé de flor em flor... são encantadores.

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...