terça-feira, 22 de maio de 2012

CARTA ABERTA AO MINISTRO DA EDUCAÇÃO

Pela sua relevância destacamos aqui um comentário inserto no último post de António Mouzinho, sobre a "formação" em "eduquês" que o Ministério da Educação e Ciência está a fazer aos professores avaliadores de exames:

Ex.mo Senhor Ministro da Educação:

Sou Maria da Graça Martins, professora de Matemática da Escola Secundária Emídio Navarro de Viseu, onde já tive o gosto e prazer de o convidar e de consigo estar algumas vezes.

Tenho, desde que o 12.º ano existe, corrigido, anualmente, provas de exame: duas excepções apenas, a meu pedido: nos anos em que os meus filhos fizeram exame de matemática do 12.º ano. De resto, quer esteja ou não a leccionar aquele ano, tenho sido sempre chamada para as correcções e algumas vezes recursos (como aconteceu no ano passado).

No ano lectivo anterior, sem qualquer consulta vi-me com um “contrato” com o Ministério  para corrigir provas por 4 anos. Mas para tal o Ministério deu-nos uma formação de fraca memória. Este ano também fui informada, que teria de efectuar uma Formação. Tive esperança que desta vez fosse mesmo FORMAÇÃO. O que implicaria aprender algo! Ou melhorar!

Estou em plena formação forçada!

E o desencanto (manda a boa educação e bom senso que utilize este termo) está a tender para mais infinito. Um organismo que pertence ao Ministério que V.ª Ex.ª coordena /dirige a obrigar os professores a comentar /concordar com textos de duvidoso valor científico. Não fosse ousadia da minha parte, convidá-lo-ia a dar uma vista de olhos por tais textos: o construtivismo no seu melhor! E é o GAVE que o faz! Terei que concluir que todas as conversas que tive o prazer de ter com Vª Exª , ainda quando não ocupava este cargo, todas as intervenções públicas, tanto na TV como em encontros e congressos, todos os textos e livros que escreveu, muito pelo que lutou, estão agora a ser passados para trás das costas e aí vêm, com grande força os teóricos da pedagogia e os ideólogos do “eduquês”.

Sinto-me indignada e não sei se terei coragem/paciência/disponibilidade mental para prosseguir com tal “Formação”. Mas não sou a única! No blogue Rerum De Natura aparecem dois textos sobre esta mesma formação: nos dias 19 e 20 de Maio.

Parto do princípio que o Sr. Ministro nunca lerá este meu email. Escrevo-o, no entanto, na esperança de que, quem o ler, alguém do seu gabinete, tenho uns minutos para averiguar toda esta situação que, de certa forma, coloca até o sr Ministro numa posição bastante embaraçosa – como conciliar o que até aqui tem defendido e até lutado, com as teorias que do seu Ministério estão a ser emanadas?

Atenciosamente,
Maria da Graça Martins

6 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Se a colega Maria da Graça Martins permitir, declaro-me assinante do seu texto.

Joaquim Manuel Ildefonso Dias disse...

Professora Maria da Graça Martins;


Eu não sou professor; por isso não sei ajuizar ao que a Senhora Professora se refere quando se mostra “indignada” e diz “e não sei se terei coragem/paciência/disponibilidade mental para prosseguir com tal “Formação”.” [costuma-se dizer só quem passar por elas é que sabe o que custa; sou no entanto solidário, por principio, a quem não têm condições para exercer a sua profissão da melhor forma]. E o seu comentário, é disto que trata, falta de condições para exercer a sua profissão.


Mas pergunto-lhe: Essa formação dos Professores de que forma se reflete nas lições do Professor e prejudica, dessa forma os alunos?
Eu confesso que não sei. Creio no entanto que esse problema, de que fala, não deve ser acessível para um não Professor.


Mas há matérias que são nefastas para os alunos e que são tão evidentes e tão acessíveis a um não Professor, falo de livros e manuais escolares, e destes eu posso falar, porque tenho acesso a eles; recentemente transcrevi no DRN um exercício para preparação de exame (sobre um pacote de bolachas) que me pareceu muito pouco criterioso.


Estes aspetos um não Professor pode falar, porque os entende, e por norma os professores não falam neles, porque referem-se a pessoas em concreto, etc.

Em concreto: Como se ensina?! e a qualidade dos manuais escolares, quem os escreve?! dou-lhe um exemplo que me aconteceu:


Recentemente, um familiar (com fracos recursos económicos) pediu-me apoio nos estudos de matemática, o tema era Análise Combinatória, a que eu acedi, mas salvaguardei logo que não sou Professor de matemática. Preparei-me com o cuidado que julguei necessário, e estudei o Capitulo XI Analise Combinatória do Compêndio de Álgebra do Professor Sebastião e Silva.


Chegado o grande dia, eu tinha tudo preparado, sabia o conceito de conjunto ordenado, sabia as definições, sabias as fórmulas porque as sabia deduzir, percebia tudo só pelo facto de ter estudado por um livro em que a matéria está exposta como se fosse Arte.


Ao contrário o aluno estava a leste de tudo, e não se pense que era mau aluno a matemática, até era dos que tinha melhores notas na turma...


Apercebo-me quer pelo caderno do aluno (apontamentos das aulas), quer pelos apontamentos facultados pelo Professor, (muitos exemplos e exercícios sem critério, com linguagem confusa em alguns casos brasileira..., havia também uma folha dada pelo Professor com as fórmulas para aplicar (que eram aplicadas um pouco à sorte...) enfim, resumindo era tudo um grande confusão na cabeça do aluno, eu também fiquei confuso com aquilo.


Depois sugeri que coloca-se-mos os seus apontamentos das aulas e estuda-se-mos um pouco o Capitulo XI da Analise Combinatória, mas o aluno, passado um pouco manifestou-me o desejo de abandonar a leitura, porque não era assim que o Professor ensinava, que precisava era de fazer os exercícios das aulas, que os do teste iriam ser parecidos e se já os conhecesse bem não se enganaria na aplicação da fórmula, etc.


Fiquei também com o desencanto a tender para mais infinito; como é possível?! o Capitulo XI da Analise Combinatória do Compêndio de Álgebra do Professor Sebastião e Silva não servir para ensinar os jovens?!...


Eu considero que dificilmente haverá no mundo um Capitulo de Análise Combinatória que melhor ensine, e que me corrijam os Professores de Matemática, e digam aqui se conseguem encontrar melhor;
Mas a verdade é que não serve para o nosso ensino!!
Porque será? porque ensina os alunos?!! e além disso “obriga” a que os Professores saibam de Análise Combinatória para poder ensinar?!! Só pode ser... não encontro justificação.


Cordialmente,

Joaquim Manuel Ildefonso Dias disse...

Professora Maria da Graça Martins;

Só para concluir o raciocínio do meu comentario;

Digo-lhe: Um aluno com este tipo de ensino até pode tirar 20 valores no teste que o Professor lhe apresentar, mas eu garanto-lhe, que essa nota não reflete o seu verdadeiro conhecimento, que passado pouco tempo está a zero se é que dai alguma vez saiu; que não aprendeu absolutamente nada; que não sabe refletir sobre um problema e que tudo não passou de "colagens",...
e digo-lhe mais ainda, Professora Maria da Graça Martins, que esse ensino só contribui para criar frustrações pessoais nos alunos, é o caminho mais curto e certeiro para o insucesso escolar.


Cordialmente,

Anónimo disse...

Caro Joaquim Dias

Pergunta “Essa formação dos Professores de que forma se reflete nas lições do Professor e prejudica, dessa forma os alunos?”
Teoricamente esta formação pode não se reflectir nem prejudicar as lições do Professor ( devo aqui confessar o meu enorme prazer e satisfação pela delicadeza e simpatia da linguagem utilizada: “lições do Professor” e “Professor” com P maiúsculo – sinto-me, sendo Professora , muito honrada e lisonjeada).
No entanto, são horas diárias de trabalho consumido a efectuar tarefas que nada contribuem para a melhoria do meu desempenho. E como o dia não estica, são horas subtraídas ao trabalho de preparação das aulas. E nós trabalhamos diariamente com jovens, com alunos. Para tal é extremamente importante a disponibilidade, o empenho e o gozo. Cito-lhe uma pequena passagem de Elon lages Lima : “ o bom professor é aquele que vibra com a matéria que ensina, conhece muito bem o assunto e tem um desejo autêntico de transmitir esse conhecimento, portanto interessa-se pelas dificuldades dos seus alunos e procura colocar-se no lugar deles , entender os seus problemas e ajudar a resolvê-los.”. Para isso é necessário muito tempo de atenção, estudo, preparação, correcção atempada de testes e questionários. Ora ter que fazer uma coisa que exige bastante tempo só porque o ME assim o decidiu e que considero sem qualquer interesse, vai na prática, prejudicar a prestação do professor.
Mas mais adiante escreve – “ (...)o aluno, passado um pouco manifestou-me o desejo de abandonar a leitura, porque não era assim que o Professor ensinava, que precisava era de fazer os exercícios das aulas, que os do teste iriam ser parecidos (...)”
Este é um dos grandes problemas da Matemática – ou uma das principais razões do grande insucesso em Matemática. Os alunos não trabalham. É extremamente difícil, quando se têm alunos do 10º ano, criar-lhes hábitos de trabalho e de autonomia no trabalho. Daí o aluno querer abandonar a leitura. É mais simples fazer exercícios repetitivos do que entender um conceito ou fazer uma pequena demonstração. É uma tarefa muito difícil mudar estes hábitos nos alunos. Às vezes é mesmo uma guerra perdida, quando, em casa, não têm ninguém a concordar. É por isso que quando o livro adoptado era o livro do Professor Sebastião e Silva ( era o meu livro!) penso que era mais fácil ser Professor!
Vou citar novamente Elon Lages Lima “O nosso povo não tem a noção exacta do valor da educação...”. E nós na Escola sentimos isso .
Atenciosamente
Maria da Graça

Anónimo disse...

Com todo o gosto
Maria da Graça Martins

Joaquim Manuel Ildefonso Dias disse...

Professora Maria da Graça;

O ensino que eu descrevi foi também o meu, e por isso estou confuso, como é possível em 20 anos estarmos ainda na mesma. Confesso: que quando terminei o 12º ano não sabia nada de matemática, (estava no zero); que todo o ensino não passou de um descarregar de matéria para os testes, que todo o esforço estava em memorizar para o exame; que uma vez terminado o exame e logo que abandonasse a sala não me conseguia lembrar de quase nada (eram “colagens”).

Que me perdia em cálculos cujos valores eram por vezes absurdos e nem tinha a capacidade de perceber isso..., que me colocavam a fazer páginas e páginas de Derivadas (como se fosse uma receita) e nem sequer o Conceito de Derivada eu compreendia.... e tudo o mais que a Professora Maria da Graça pode imaginar.

Obrigado pelo sua resposta, e peço-lhe que não desista, pois o seu trabalho é muito importante, permita-me mostrar isso com uma citação do Professor Sebastião e Silva.

“(...) entre os rapazes e as raparigas que frequentam os liceus, há, relativamente, um grande número, que não virá a fazer uso efectivo de Matemática, exceptuadas aquelas rudimentares noções aritméticas de aplicação quotidiana. É verdade que, mesmo para esses, o ensino da Matemática oferece vantagens indiscutíveis, não pelos conhecimentos que faculta, mas pelos serviços que presta na formação da inteligência.”

Cordialmente,

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