segunda-feira, 20 de junho de 2011

A ESCRITA NA COMUNICAÇÃO DE CIÊNCIA - um exercício na Casa da Escrita



Crónica semanal publicada no "Diário de Coimbra"

Narrativa a propósito do 1º Atelier de Escrita em Comunicação de Ciência que organizei no passado dia 17 de Junho de 2011, na Casa da Escrita em Coimbra.

Alguém bateu à porta com gentileza.

“Entre, se faz favor”, ouviu-se de dentro com a pressa da surpresa. Era o João Cochofel, cuja família vivera na casa, na Rua João Jacinto, nº 8, em Coimbra, onde um grupo de 14 pessoas estava, agora, reunido à procura do modo como comunicar ciência de forma mais funcional e eficaz, através da escrita, essa arte antiga e intrínseca à humanidade.


João José Cochofel (1919 – 1982) entrou para a sala e sentou-se numa cadeira que aparentemente ficara a mais, mas que agora anunciava a razão da sua disponibilidade. “Interessante está Vossa reunião! Nunca pensei que aqui, onde tanta gente se reuniu ao redor da funcionalidade da escrita, da sua estética, da sua potencial comunicabilidade imediata através da síntese poética, pudessem reunir-se gente interessada em escrever sobre ciência e para a comunicar aos outros!”

“É uma honra”, dissemos, “Podermos estar aqui hoje, dia 17 de Junho, neste espaço de intuição e tumulto criador, animados pelo seu testemunho. Deste “vértice” olhamos para o que fazemos. Interrogamo-nos como o fazer melhor, com mais emoção e afecto, mas com rigor.”

João Cochofel, poeta e ensaísta maior da nossa escrita e cultura portuguesa, levantou-se e respondeu. “Discutem então sobre como comunicar efectivamente, e com afecto, para descodificar o hermetismo da linguagem científica e depois colocarem o produto dessa tradução numa outra linguagem, que não é mais nem menos do que escrita em língua portuguesa! No fundo estão a debruçarem-se sobre algo que estas paredes muito reflectiram: a criação literária! Vejo o espanto iluminar as vossas faces desconfiadas. De facto, parecem-me preocupados em conseguirem comunicar de uma forma simples. Mas sinto a vossa imaginação carregada com o lastro do rigor da informação. Ouvi-vos, antes de vos interromper, discutir muito sobre esse fenómeno da diluição do rigor da informação com o fluir da mensagem. E o que podem ou não fazer para colocar diques para o reter. Porque não usam tinta permanente sobre papel para fixarem essas vossas preocupações? No fundo o que estão aqui a fazer, nessa minha velhinha casa, hoje emancipada Casa da Escrita, é um exercício de criação literária!”

“Não ousamos a tanto”, retorquimos, “Mas, sim. Esforçamo-nos para traduzir a escrita científica para uma escrita acessível ao senso comum”. “Hoje, neste exercício, vamos de facto criar novos textos com esse propósito. Vamos escrever para que o João Cochofel também entenda as novidades que chegam da frente do conhecimento, neste século XXI. Embalados pelo ambiente íntimo mas amplo, reflexivo mas fluido e intuitivo na alvura das paredes desta Casa da Escrita, horizontes iluminados pela generosidade da luz que nela renasce”.

“Mas quem sois vós? De que territórios formais vêm?”, indagou Cochofel.

“Vimos de locais diferentes: Aveiro, Coimbra, Lisboa, Porto. Temos formações diferentes: biologia, bioquímica, física, jornalismo, astronomia. Trabalhamos em locais diferentes: centros interactivos de ciência, museus, imprensa escrita, universidades. Mas temos um denominador comum: o de estarmos interessados e mesmo preocupados em comunicar melhor o conhecimento científico a cujo acesso todos os cidadãos tem direito.” “Se quiser ter a maçada de pedir, em imaginação, ao Curador deste espaço, o Professor Doutor José Carlos Seabra Pereira, que tão bem nos acolheu, que lhe dê acesso aos manuscritos que aqui vamos deixar, com o que escrevemos neste dia, verá que foi um dia bom e produtivo. Esperemos que as sementes que hoje cultivamos espalhem a notícia. A todos, e também através dos novos suportes para a escrita como seja a internet, neste endereço.”

(Agradeço o apoio da Casa da Escrita, do Museu Nacional Machado de Castro, da Imprensa da Universidade de Coimbra, aos Profs. Doutores Milton da Costa e Rui Ferreira Marques, e à Cozinha de Autores da Joana Dias.)

António Piedade

9 comentários:

Ricardo Reis disse...

Esperemos que João Cochofel (onde quer os seus átomos se encontrem neste momento), goste dos textos que produzimos em sua casa.

Da minha parte, foi um prazer partilhar esta experiência com os restantes participantes, que soube a muito pouco.

Cláudia disse...

Toda casa da escrita
representa uma crípta
com letras por verdade
de um tempo sem idade.

Anónimo disse...

É Pá, já deixaram de odiar a poesia neste blogue?

Anónimo disse...

Vai-se tolerando, pá, vai-se tolerando, desde que não seja "minha"! JCN

Anónimo disse...

Perante a "minha" poesia são como os touros ante o pano vermelho! JCN

Sara Luis disse...

Para quando outra iniciativa idêntica?

António Piedade disse...

Cara Sara Luis
Em breve anunciarei, em lugar próprio, uma série de eventos similares a realizar até ao final do ano.

Anónimo disse...

António, um dia um acadêmico de direito em plena capital brasileira, perdido pela internet à procura de filosofia, deu de cara com um jovem a fazer poesia com química. Ele precisou de 22 translações e um pouco de poesia p/ ele perceber seus sentimentos pela química, biologia e pela escrita; mas a partir desse dia...
Eu nem vou agradecer muito pelo seus textos, a vida já agradece.

Amplexos
Hugo Perpétuo

Anónimo disse...

Que prosa... tão rebarbativa! Será para a gente... não entender? Só pode!... JCN

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...