terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

As fracturas morais

Novo texto de João Boavida, antes saído no diário As Beiras.

Há poucos dias ocorreu no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa o XVIII Colóquio da AFIRSE (Associaction Francophone Internationale de la Recherche Scientifique en Education) cujo tema foi Deontologia, ética e valores na Educação – utopia e realidade. Talvez não haja hoje tema mais actual e mais pertinente, mas o subtítulo - utopia e realidade - dá que pensar.
«Considerado por uns como um caminho de esperança fundamentada para um mundo melhor e mais equilibrado, embora considerado por outros como uma utopia inócua, o apelo ao reforço ou retorno à reflexão ética tem-se multiplicado em várias instâncias da vida social. Este apelo ganha particular pertinência perante a actual crise que assola o mundo em que a quebra de ética e de valores desempenha um papel considerável».
Foi esta a ideia com que os organizadores apresentaram e justificaram o congresso. É uma ideia já corrente: A actual crise económica, que tantos dramas está a provocar em todo o Mundo, é o resultado da quebra de regras, da falta de prudência, da ganância sem limites, da total falta de consideração pelas necessidades e direitos dos outros, etc. Enfim, coisas que no ultra-liberalismo económico nada contam, porque os mercados tudo mandam, apesar de, afinal, estarem a destruir-se a si próprios.

Durante três dias, portugueses, franceses, brasileiros, espanhóis fizeram conferências, debateram em mesas redondas, discutiram em simpósios, num total de mais de duzentas comunicações. Tudo à volta dos valores no ensino, do básico ao superior, nas empresas, nos serviços, nas comunidades, segundo as mais variadas perspectivas e experiências, mas todos com a mesma preocupação e pressupondo a mesma ideia: sem moral nem bons costumes não é possível viver.

Os que pensam, que tudo isto é conversa de moralistas (termo hoje pejorativo) de retrógrados (como se a fuga em frente fosse solução) ou de reaccionários (como se não fosse necessário, em certas situações, reagir, lutar contra) devem perceber que o mundo só funciona porque há regras e porque a maioria as vai cumprindo, e vai tendo noção do justo e do injusto, do correcto e do incorrecto, do bem e do mal.

E os educadores ao debaterem e analisarem situações, casos, experiências, investigações, procuram contribuir para melhorar as coisas, aliviar o mundo dos negros presságios. Mais uma vez está na mão deles trabalharem para um mundo que vá melhorando. Se todos, aos mais diversos níveis em que se situassem, tivessem consciência da sua responsabilidade e bom senso suficiente para educar bem, a utopia tornar-se-ia realidade.

Mas as coisas não são bem assim. E, portanto, é mais fácil aos gananciosos sem moral alcançar o poder e ter força, dando maus exemplos e deseducando, que aos justos e compreensivos mostrarem e imensa vantagem das suas acções.

Uns impõem a si mesmo as regras da justiça, os outros não. Portugal é hoje um bom teatro desta eterna guerra do Mundo.

2 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Os dois últimos parágrafos deste artigo parecem-me uma radiografia muito impressiva do ambiente que se vive na sociedade portuguesa, e em particular no interior das nossas escolas, onde o muito de bom que se faz (ou tenta fazer)é dramaticamente submergido e anulado pelo mal que cresce e se multiplica. E poder ignora.

Fartinho da Silva disse...

Utopias! Julgo que o autor se esqueceu de dizer que onde ocorreram os maiores desastres da humanidade foi precisamente nos países onde se tentaram implementar as utopias! Exemplos? Comunismo (antiga União Soviética, actual Coreia do Norte, etc.), nacional-socialismo (Alemanha, Japão, etc.), entre muitos outros.

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