sexta-feira, 28 de março de 2008

A MATEMÁTICA NÃO É CHINÊS


Minha crónica do "Público" de hoje (a última frase, infelizmente, não saiu):

Os resultados dos testes internacionais PISA, divulgados no fim de 2007, revelaram não só uma má posição de Portugal (26º lugar entre os 30 países da OCDE) como uma ausência de progressos na aprendizagem da Matemática pelos nossos jovens de 15 anos (a sua pontuação, 466, a mesma que em 2003, ficou abaixo da média da OCDE, 498). Mas o curioso é que, bem próximo de nós, embora à nossa frente, ficaram os Estados Unidos (com 474 pontos). Aqui não aconteceu nada, mas do lado de lá do Atlântico os sinos tocaram a rebate. Acaba de ser divulgado o relatório de uma Comissão Nacional, de nomeação presidencial. O relatório, que contou com a participação do Conselho Nacional de Professores de Matemática, classifica a prestação americana no ensino e aprendizagem de Matemática de “medíocre”, pelo que a nossa será “medíocre menos”. O estudo propõe mudanças de tomo: quer moderar o chamado ensino centrado no aluno (a investigação pedagógica não conclui pela sua superioridade) e propõe objectivos curriculares precisos em cada ano (por exemplo, as fracções devem ser dominadas entre o 5º e o 7º anos) assim como metodologias para os atingir (por exemplo, maior recurso à memória).

O relatório americano devia ser lido e reflectido. Ele diz-nos que os alunos que confiam nos seus dotes não aprendem tanto como aqueles que acreditam que o sucesso depende do seu trabalho. O “chairman” comentou: A aproximação à Matemática baseada no talento, isto é, que ou se tem jeito ou não, como para tocar violino, tem de ser mudada.

Pior do que os nossos maus resultados é a indiferença perante eles. A Sociedade Portuguesa de Matemática clamou na altura por uma mudança urgente. Mas não foi ouvida nem, muito menos, convidada para participar em qualquer processo de revisão profunda. E o mesmo aconteceu com a Associação de Professores de Matemática. O Ministério da Educação, confrontado com os dados do PISA, desvaloriza-os. Dá pena ver o esforço das autoridades nacionais para os menosprezar (chegam a ufanar-se de termos resultados semelhantes a outros países mediterrânicos, como a Itália, a Grécia e a Turquia). Quando não os menosprezam, esforçam-se por desculpabilizar um sistema que se viu a nível internacional tão cruamente retratado.

O primeiro lugar da literacia matemática foi ganho por Taiwan (549 pontos) seguido pela Finlândia, Coreia do Sul e Hong Kong. Digno de louvor é o 8º lugar conseguido por Macau (525 pontos), outrora português e hoje chinês. Um amigo meu comentou, sarcástico: Há uma boa maneira de subir no PISA. É entregarmos a administração do território... A China propriamente dita estava fora da amostra, mas os resultados não seriam muito diferentes dos de Taiwan, Hong-Kong e Macau. O que terão os jovens chineses de diferente dos norte-americanos e dos nossos?

A resposta tem a ver com a aprendizagem e com o ensino. Kevin Miller, professor de Psicologia na Universidade de Michigan, explicou, numa conferência em Coimbra, a relevância das diferenças culturais e pedagógicas, que ele próprio tem investigado. Afirmou: Nos EUA aceita-se que não perceber nada de Matemática é uma espécie de ‘medalha’. O mesmo não acontece na China, onde os alunos têm interesse pela aprendizagem, pois a cultura, a escola e os professores estimulam esse interesse (...) Numa cultura como a americana os alunos tendem a esconder as suas dificuldades e, sempre que podem, fazem escolhas que contemplam níveis menos exigentes de matemática, ou de onde ela está mesmo afastada. E acrescentou: Apesar das diferenças de ensino entre os vários estados e entre escolas, há nos EUA um padrão de ensino assente na exposição do professor e na solicitação aos alunos para repetirem a informação fornecida. Em contrapartida, na China os professores além de proporcionarem uma informação sólida, procuram que os alunos expliquem os procedimentos. Assim, estimulam-nos muito mais a comprender o que vão aprendendo.

A Matemática não é chinês, podemos aprendê-la como na China.

24 comentários:

G. Mbeki disse...

Se "há nos EUA um padrão de ensino assente na exposição do professor e na solicitação aos alunos para repetirem a informação fornecida", então não existe "o chamado ensino centrado no aluno" e sobre a qual, pelos vistos, a "investigação pedagógica não conclui pela sua superioridade". Por outro lado, quando "os professores além de proporcionarem uma informação sólida, procuram que os alunos expliquem os procedimentos", como acontece na China que tem os (presumivelmente) bons resultados, a isso chama-se, em bom eduquês, "ensino centrado no aluno". Em que ficamos, afinal?

Carlos Pires disse...

A contradição, apontada por G. Mbeki, entre a necessidade de “moderar o chamado ensino centrado no aluno” e a crítica a “um padrão de ensino assente na exposição do professor e na solicitação aos alunos para repetirem a informação fornecida” talvez seja só verbal e não diminui o alcance das palavras de Carlos Fiolhais.
O carácter intrinsecamente pernicioso das aulas expositivas é um mito inventado pelos teóricos do “eduquês”. A existência de períodos de exposição nas aulas não implica que apenas se peça aos alunos “para repetirem a informação fornecida” e é perfeitamente compatível com uma atitude crítica e activa dos alunos perante a aprendizagem.
Para que os alunos aprendam realmente os conteúdos de uma disciplina (qualquer uma e não apenas da Matemática), em vez de apenas os decorarem, é preciso que, como disse o psicólogo citado por Carlos Fiolhais, saibam “explicar os procedimentos”. O que implica, entre outras coisas, a realização de muitos exercícios (cuja natureza varia de disciplina para disciplina) e a tentativa sistemática de aplicar a matéria leccionada, mostrando que se relaciona com coisas concretas e importantes do mundo e que permite resolver ou pelo menos clarificar problemas. Ora, isso não é incompatível com a existência de aulas expositivas, mas sim com a existência de aulas APENAS expositivas.
Para conseguir que os alunos chineses tenham a atitude descrita, os professores chineses centram o seu ensino, não no aluno e nas suas idiossincrasias pessoais (como pretende o “eduquês”), mas nos conteúdos – nos conhecimentos de Matemática, Física, Biologia, etc.
Tal como defendem que as aulas expositivas são sempre más, os teóricos do “eduquês” consideram que há métodos milagrosos (trabalho de grupo, trabalho de projecto, etc.) que levam sempre à compreensão e ao gosto pela aprendizagem.
O que é obviamente falso. Os alunos ao efectuarem, por exemplo, um trabalho de projecto podem ficar tão entediados e ser tão passivos e acríticos como durante uma exposição oral do professor. A utilização desse género de metodologias não garante por si só que os alunos desenvolvam o seu espírito crítico, nem que compreendam em vez de papaguear. Não garante sequer que gostem das aulas.

Carlos Pires

Anónimo disse...

Até nos EUA existem diferenças nos resultados em testes de matemática entre asiáticos e não asiáticos embora o sistema de ensino seja o mesmo.

Como justificar isto?

Mas falar nestas diferenças é politicamente incorrecto.

Independentemente da censura do politicamente correcto elas existem a pelo menos 1σ.

E um link para os dados em bruto do estudo? Talvez fosse informação relevante.

Anónimo disse...

Mas existe o reverso da medalha.

Apesar dos orientais terem quase sempre melhores resultados nestes testes, a sua contribuição (mesmo em termos absolutos já nem falo per capita) para a produção de conhecimento matemático (avanços fundamentais) é ridícula quando comparada com a dos EUA.

Isto mesmo considerando apenas os cidadãos dos EUA de origem asiática que já lá nasceram.

G. Mbeki disse...

Do que eu sei do "eduquês", nunca nos textos em que se fala de "ensino centrado no aluno", ou "aprendizagem por descoberta" (ou "descoberta orientada", ou "por pesquisa" na sua mais recente versão, numa tradução mais directa do "inquiry based learning" de que toda a Europa anda a falar) se diz que se deve eliminar a parte expositiva das aulas. Diz-se sim, e concordo que se possa dar, por vezes, um enfase exagerado, que deve ser dada mais atenção a projectos, trabalhos e actividades centradas no aluno e que desafiem a capacidade crítica, como um método mutuamente complementar ao ensino expositivo. Mas está na moda criticar cegamente o eduquês - que tem os seus excessos, sem dúvida, como qualquer corrente de pensamento. De qualquer modo não contesto a ideia geral do texto original, de que o sucesso escolar depende muito do contexto cultural. Mas há fragilidades na argumentação que são evitáveis...

Anónimo disse...

g.mbeki
A minha primeira impressão foi a sua. Há aqui contradições ou pelo menos, alguma incongruência.
Julgo que qualquer professor que se preze, andará como um tolo no meio da ponte entre as ideias romãnticas do eduquês e as algumas certezas que o expositivo acarretam.
Foquemo-nos nos tempos de concentração dos alunos, o attention spam, se a memória não me trai. Os bons alunos, mantêm-nos mais tempo quer em aulas mais centradas nas prelecções, demonstrações, explicações, exposições dos professores, quer nas aulas centradas nos alunos tout court. Eu julgo que as actividades em grupo, se o grupo for heterogénio, criam mais perturbação nos alunos com menores capacidades do que as aulas mais tradicionais. Os piores aprendedores, no grupo, quando confrontados com o trabalho dos melhores, que até têm a tendencia a puxar a si as rédeas dos acontecimentos, desistem logo e mais facilmente. O outro consegue o que ele não consegue num menor período de tempo e, muitas vezes, chama logo burro quando ele se manifesta e diz que não está a perceber. Claro que temos que trabalhar esses aspectos com eles, mas eu nto que os fracos logo desligam, calam-se, recuam nas tarefas de grupo. A menos que a tarefa seja em pares. Pessoalmente, eu gosto mais do trabalho a 2. Gera menos exibicionismo dos bons, gera mais cooperação entre o melhor e o mais fraco, e a oportunidade de o mais fraco exprimir a dúvida porque o grupo que o observa e mede não é tão grande. E gera menos penduranço dos baldas no trabalho do outro e, caso mesmo assim haja penduranço, nós como professores, damos por isso muito mais rapidamente do que no grupo maior.

Portanto, pessoalmente, eu cada vez trabalho mais em grupos de 2,3 alunos. Quando trabalho em grupo.
Outra coisa que tenho observado ( 2º ciclo) é que há uma tendencia generalizada do aluno em querer estar sózinho, querer trabalhar sózinho, o que é curioso e acaba por contrariar a primazia do grupo das correntes pedagógicas eduquesas. Os meus alunos, cada vez mais, me pedem, tanto os muito bons, como os assim-assim, como os muito fracos, para estarem sózinhos nas carteiras! Isso não vos acontece? Argumentam que se distraem menos, que trabalham melhor, etc. Por vezes, aí sim, perante uma actividae qualquer, pedem para se juntarem a A ou a B.. Claro que não tenho condições para pôr um aluno por carteira, costumo dizer-lhes em brincadeira que só se os começar a pendurar no tecto. Mas asseguro-vos que todas as santas aulas, em todas as santas turmas, tenho os alunos todos a pedirem-me para os deixar sózinhos!
Eu, pela parte que me toca, ando atenta a estes sinais: só reforçam a teoria das turmas mais pequenas, em que o aluno sinta ( e eu acho isso muitíssimo legítimo se pensar bem no assunto) que há um espaço individual dele na sala de aula ( se calhar ao menos esse espaço na sua vida) e leio isso não como um sinal de individualização doentia, mas por um pedido de socorro quase. O aluno quer ser auto-responsavel e mostrar-me que, estando sozinho, a sua quota de atenção na aula depende só dele. E isso tem-me parecido saudavel. E depois, lá está, quando ´sozinho, perante uma actividade, é ele próprio a solicitar a agregação a 1 ou 2 outros colegas. Isto tem-se passado nas minhas aulas. Não sei se se passa com mais colegas, seria interessante aferir esta tendência.

LA disse...

Bom artigo do Fiolhais, parabéns!

just teasing: as pessoas que têm a capacidade de fazer inovações matemáticas estavam bem lixadas se dependessem dos seus professores do secundário. Um grande matemático não depende absolutamente nada de quem teve como professor, é indiferente.

Maria, acho que tens muita razão, eu também detesto trabalhos de grupo. Como é que é possível resolver uma equação no meio duma discussão de 5 pessoas? É uma coisa completamente contrária ao processo normal: usar concentração profunda, quase meditação, porque não se podem fazer algumas coisas no meio de 5 pessoas a tagarelar.
Os trabalhos de grupo são bons para tretas que não valem nada ou para um gaijo conhecer melhor as chavalas da turma.

Carlos Pires disse...

1. Embora discorde das críticas cegas, gostaria imenso que G. Mbeki tivesse razão quando diz que “está na moda criticar cegamente o eduquês”, pois no meio de tantas críticas haveria certamente muitas críticas lúcidas e fundamentadas.
Infelizmente, tudo indica que a moda é favorável aos defensores do “eduquês”. Formataram a cabeça de muitos professores. E dominam simultaneamente duas instituições que, neste momento, parecem adversárias mas que na verdade são aliadas: o Ministério da Educação e os Sindicatos de Professores. Duas provas desse híbrido domínio:
A) Os defensores do “eduquês” influenciaram a concepção por parte do Ministério de um modelo de avaliação do desempenho que valoriza a diminuição da exigência e promove a inflação das notas dos alunos e, simultaneamente, inspiraram as críticas dúbias e equívocas dos Sindicatos, que nunca apresentaram um modelo alternativo de avaliação e nunca falaram nem falam da evidência: avaliar de modo justo os professores só será possível quando em Portugal existir um sistema exigente e rigoroso de avaliação dos alunos, ou seja, exames nacionais a todas as disciplinas de “estudo”. (Para os defensores do “eduquês” os exames nacionais são algo maléfico e inimigo da verdadeira aprendizagem.)
B) Os defensores do “eduquês” influenciaram a reacção equívoca e relativista do Ministério aos casos de indisciplina e violência nas escolas que têm sido tornados públicos, mas simultaneamente condicionaram as críticas e propostas dos Sindicatos, que nunca falaram de punições. (Segundo o “eduquês” e a Psicologia barata, a culpa é sempre da sociedade, pelo que responsabilizar e punir o aluno agressor seria uma atitude fascista, pois este não passa de uma vítima do sistema.)
2. Maria fala das “ideias românticas do eduquês”. E acha que o bom professor se deve sentir divido entre elas e o realismo. Românticas? A deturpação ideológica dos factos e a negação de realidades evidentes são românticas? Não, não são: são ideias erradas, mas alimentadas por pessoas que ganham com a sua divulgação e sucesso (professores universitários que não conseguiriam dar aulas a não ser num curso de Ciências da Educação, formadores de professores que ganham uma pipa de massa a dar acções de formação ridículas e inúteis e políticos interessados em dizer que o sucesso escolar aumentou, mesmo que se trate de uma aldrabice).

Carlos Pires

Anónimo disse...

la:
gostei particularmente dos "gaijos" a conhecerem as chavalas! :)))))))
Nos meus níveis etários, eles ainda são românticos e monogâmicos: estão apaixonados ou apaixonadas por uma única pessoa e ainda não deram em predadores engatatões :))).
Mas eu também não me entendo lá muito com os trabalhos de grupo, tenho sempre dificuldades em seguir aquela barulheira toda. E mais, aquilo demora sempre mais do que o previsto. O grupo X acabou, o Y não começou, o Z vai a meio, e depois, nas idades dos meus, pegam-se por tudo e por nada; se se cumpre o tempo, eles ficam de tal maneira excitados que o assentar da poeira é difícil. Ou seja, pode ser defeito meu, mas que não vejo lá grandes vantagens não. Até porque eles conhecem-se muuuito bem entre si e usam esse conhecimento das características pessoais de cada um como estratégias para trabalhar ou boicotar ou ajustarem contas de situações entre eles próprios, mas acima de tudo, para usarem esse conhecimento como ferramenta para justificar tudo- é o ele nunca faz nada, é o ele è que quer fazer tudo sozinho, é o ele está sempre a chatear, é o ele só nos está a mexer nas borrachas, é o outro que não percebe nada, a outra que nunca fala, enfim, tudo serve.
Ajuda-me o facto de ter um filho de 13 anos, no 7º, que é bom aluno (até ao momento) e que me vai trnsmitindo as sensações dele nos trabalhos de grupo. E a verdade é que ele só gosta de trabalhar com dois dos colegas e amigos dele. Quando as professoras/es dele mudam os grupos, aquilo corre sempre mal. E atenção que este relativo gosto pelo trabalho em equipa só lhe apareceu este ano. Eu tento não me meter... ele que se entenda com os professores dele e com os colegas. Dou sermão e tal, mas adiante.
Mais uma achega. Todos os miúdos são naturalmente individualistas e egocentricos até certa idade. É uma caracte´ristica da infãncia que só quem não tem filhos ou não se lembra de como eles eram em pequenos não conhece.
Os defensores dos TG deviam, dado o eduquês compreensivo, holístico, construtivista, "da assimilação solidária" (já não há pachorra) serem mais sensíveis a este facto irremediável da própria infãncia. Ok, tem que ir sendo combatido, em casa, na escola, para construirem uma personalidade mais solidária e altruísta, mas, caramba, temos que dar tempo ao tempo e as coisas vão aparecendo com naturalidade e com a maturidade. É assim em tudo na vida.
Mas, pronto, sou uma modesta professora de Mat e CN, com uma rodada de eduquês que me traumatizou :) porque por circunstãncias várias, tive mesmo que andar numa ESE 4 anos e fazer a licenciatura toda, e acabei-a há poucos anos ainda.. enfim. Agora, ando metida no Prog Form Cont de Mat no 2º ciclo e..... em Abrantes, tudo se reforça como dantes ( para bom entendedor..)

Anónimo disse...

Carlos,
nem de propósito, escreviamos ao mesmo tempo quase sobre as mesmas coisas!

Eu confesso que desde a ESE que ando um bocado como o tolo no meio da ponte. Fui para a ESE quase com 10 anos de ensino no lombinho ( não de serviço, isso é outra história) e eu julgava que era uma boa professora. Tinha resultados, conseguia ir buscar os alunos piores (sempre os priveligiei, juro, sempre foram o meu cavalo de batalha).
De repente, tive que me decidir e decidi pela ESE. Onde eu me fui meter..... trataram-me mal, muito mal. O facto de eu ter mais de 30 anos e experiência profissional funcionaram como um vírus, uma bactéria que tinha que ser erradicada. Cedo percebi que a ESE ( pelo menos onde eu andei) é autista e soberba. E, acredite ou não, reduziram-me a uma substãncia amorfa. Quiseram-me pôr no meu lugar e mandar uma mensagem clara às miúdas que eram minhas colegas e às não tão miúdas também: esta aluna representa o maaalll. Curiosamente, isso aconteceu sobretudo com os docentes da matemática da minha ESE. Da parte das Ci~encias Sociais, tal não aconteceu, muito pelo contrário.
Mas não, não me formataram a cabeça. E isso, ai isso, eles fazem e bem aquela miudagem toda. E agora andam a semear o pãnico e a tortura nas cabeças das minha colegas de formação do PFCMat lá na escola.

Carlos Pires disse...

O ambiente persecutório na ESE referida pela Maria faz-me lembrar algumas experiências que tive ao estudar (numa treta supostamente profissionalizante, o Ramo de Formação Educacional, após a licenciatura em Filosofia) disciplinas como Psicologia Educacional, Introdução às Ciências da Educação e Métodos e Técnicas da Educação. Experiências partilhadas por muitos licenciados a fazer essa suposta profissionalização e por professores que efectuaram acções de formação ou mestrados na área das Ciências da Educação.
Não deixa de ser curioso observar a contradição entre o discurso dos especialistas dessa área (liberdade, criatividade, open mind, etc.) e as suas práticas, caracterizadas pela intolerância e pelo dogmatismo. São um bom exemplo daquilo a que os psicólogos chamam “dissonância cognitiva”.
Se em Portugal existisse jornalismo de investigação, isso poderia dar origem a reportagens muito interessantes e informativas. Com a atenção que a opinião pública dispensa actualmente à educação podia até ser lucrativo. Infelizmente, em Portugal não existe esse tipo de jornalismo.
Mas chega de educação e de "eduquês". Os miúdos estão a dormir
e está na altura de ler mais umas páginas do romance que ando a ler (a conta gotas, é essa a condição da actual classe média - mas isso já é outro problema).

Carlos Pires

G. Mbeki disse...

Culpar o eduquês pelo problema da avaliação dos professores e da indisciplina nas escolas era algo que nunca tinha visto, confesso. Presumo que o Carlos Pires seja um defensor incondicional do livro do Nuno Crato sobre esta temática. Como a continuação desta discussão teria de passar pela definição de "eduquês" - que já é, pelos vistos, muito abrangente -, atrevo-me apenas a sugerir uma pesquisa atenta pelo programa PRESTES em França, tendo especial atenção aos nomes que estão na génese da iniciativa, entre eles um tal Sr. Charpak...

Anónimo disse...

g.mbeki,

"Culpar o eduquês pelo problema da avaliação dos professores e da indisciplina nas escolas era algo que nunca tinha visto, confesso."

Desculpe que lhe diga, mas anda distraído. Muito distraído. Mas mesmo muito distraído. Vá ler os milhares de comentários no Público e no Expresso. Não viu o debate ( o único de jeito, pelo mesnos dos que eu vi) na Sic Notícias na quinta-feira?
Mas mete o dedo na ferida quando diz que o eduquês é muito abrangente. Eu entendo. O eduquês é o bode expiatório de tudo, é a sua opinião. E válida. Então a questão de fundo será: por que razão derivou o eduquês para uma generalização que pode comprometer algumas conquistas de todos nós ( professores e alunos) na maneira como se desenvolvem as aulas? E como derivou uma metodologia para a explicação dos pássaros?
Definir eduquês já não basta. Foi definido, e muito bem, pelo Carlos Fiolhais há uNs anos, naquele artigo. Se calhar é preciso outro artigo para o redifinir. Porque nada é estático. E quem não pensa no que se fez ou não fez, no que esteve mal ou não esteve, não pode trabalhar bem.
Mas, e tenha a amabilidade de prestar alguma atenção aos meus depoimentos e ao do Carlos Pires, as nossas impressões de persecussão, intolerância e autismo ( o dogma de que o carlos fala) não nascerão do nada. A verdade é que os Docentes do Ensino Superior das já não tão novas assim teorias do construtivismo e do ensino exclusivamente centrado no aluno ( onde o professor não fala porque não precisa- afirmado vezes sem conta pela pessoa que foi minha professora de Ensino de Matemática na ESE)são incrivelmente teimosos! Incrivelmente arreigados a uma visão intolerante de outras possibilidades para desenvolvermos as aulas. E essa intolerância e essa crença cega, esse dogma, originou anti-corpos. Tudo o que é imposto sem as pessoas verem benefícios concretos redunda nisto..
Esta mesma senhora, tinha horror, por exemplo, à Internet! Aliás, e isto passou-se há 6, 7 anos, de uma maneira geral, a Internet era vista como um demónio naquela escola. É estranho não é?
Tanto era que só de há 2 anos para cá é que aquela escola sup de educ tem um site minimamente construído.
Quando eu lhe disse que tinha sacado umas coisa da NCTM da Internet, a senhora ficou verde, azul. Julgo porque achou que eu era uma facilitista..não sei.
E já agora, foquemo-nos então nos States e na NCTM pois o país da NCTM são os States. Como é? Em que ficamos se atendermos ao artigo que o Carlos Fiolhais "postou"? São as práticas que eles lá têm e fazem, segundo a ESE.. Está a falhar? Não falha?
Desculpe-me mas nós temos que realmente nos concentrarmos no essencial E o essencial é ensinar os alunos.
Seria altura de organizar vários estudos e discussões. O ensino construtivista tem muitas e importantes qualiddaes mas não é adaptável à dimensão das nossas turmas e extensão dos nossos programas. Não é. Ponto.
Por outro lado, a miudagem não tem propriamente espírito de equipa. Se nós adultos não temos espírito de tem work, como terão os miúdos? Volto a pedir-lhe que leia os meus comentários sobre infancia e individualismo. UM Gestor de uma grande empresa queixa-se da aus~encia de team work em quadros médios e superiores de uma estrutura privada, altamente qualificada, etc etc.
E não é preciso andar duas vezes numa universidade como eu andei, para saltar á vista a ausência de team work orientado para os alunos dentro dos professores do Ensino Superior. Olhe que tanto na minha 1ª lic como na segunda, a turma tinha 30 alunos. Algum dia se ouviu falar de uma reunião entre os docentes específica para tratar dos assuntos daquela turma (sim , os nossos Conselhos de Turma). Por que razão não há CT no Ensino Superior? Nunca percebi isso. Discutirem os alunos que t~em, que problemas trazem, que capacidades trazem, que valências deverão ser priveligiadas. Darem as notas numa reunião, como nós fazemos..Por que não existe isso no ES? Se existe, peço desculpa.
Eu vou tentar encontrar o programa PRESTES para o ler.
Mas, mais uma vez, foquemo-nos no essencial: ensinar os alunos de acordo com a dimensão das turmas e a extensão dos programas. E isso, no eduquês, no tradicional~es, no Nuno Cratez em Portugal, é uma coisa que tem que ser arrepiada e pensada de forma prática e objectiva.
E bom fim de semana

Anónimo disse...

Percebe-se porque pessoas como Agostinho da Silva são completamente ignoradas pela classe académica e intelectual...



JD

Anónimo disse...

A Maria e o Carlos é que têm razão.
Também fui obrigado a ser aluno numa ESE,que juntamente com os CIFOPS, são verdadeiros antros das "Ciências" ocultas.
Entre outras, tive num semestre lectivo uma cadeira com o sinistro nome de "Desenvolvimento Curricular" que obviamente era desprovida de conteúdo e tinha como função formatar os professores de modo a facilitar a sua institucionalização.
Deixando o registo irónico e porque o assunto é grave, para quem leu e gostou do Eduquês de Nuno Crato, sugiro, a quem não conheça o imperdivel -Imposturas intelectuais- da Gradiva e de António Manuel Baptista; "O Discurso Pós-Moderno Contra a Ciência" e "Críca da Razão Ausente", ambos da Gradiva.
Para iluminar tudo isto o ESPANTOSO "Um Discurso Sobre as Ciências" de Boaventura Sousa Santos, edições Afrontamento.

Carlos Pires disse...

Acho que Nuno Crato tem razão em quase todas as coisas que tem dito, mas não sou “um defensor incondicional do livro do Nuno Crato”, como disse g.mbeki. A defesa incondicional de ideias é irracional, pois só merecem ser defendidas as ideias que podem ser justificadas. Até agora, as ideias de Nuno Crato parecem-me ser justificadas pelos melhores argumentos e por isso concordo com elas. Se amanhã Nuno Crato defender ideias que não me pareçam ser justificadas não concordarei com elas. Isso não é uma defesa incondicional. Incondicional, para mim, só os meus filhos e o desejo de conhecer fLORENÇA.
Agradeço à Maria, a g.mbeki e a Nuno Calisto os comentários, nomeadamente as críticas. Em Portugal existem poucos debates e é frequente algumas pessoas emitirem opiniões ou realizarem actividades e não terem qualquer feedback.
A propósito: o De Rerum Natura é excelente, mas talvez pudesse ser ainda melhor se os seus autores respondessem com mais frequência aos leitores que fazem comentários.
Neste caso, parece-me óbvio que Carlos Fiolhais devia dizer alguma coisa mais. Afinal, foi-lhe apontada uma contradição.

Carlos Pires

Rui Baptista disse...

Os testemunhos experenciados por Maria e Nuno Calisto devem ter em nós o acolhimento que merecem por denunciarem uns tantos factores responsáveis do mau estado do ensino em Portugal que atirou para trás das costas o conhecimento científico indo atrás do canto da sereia de modernas (?) teorias pedagógicas que, entre outros males, servem para inculcar (quantas vezes, indelevelmente) nas mentes juvenis verdadeiros abortos científicos. Alguém pode ensinar o que não sabe?

O Prof. Carlos Fiolhais tem tido a preocupação pedagógica (no bom sentido da palavra) em denunciar os fracos resultados nacionais obtidos pelo nosso sistema educativo em confrontos internacionais. Por seu turno, o Prof. Nuno Crato ao denunciar no seu livro, "O Eduquês", os malefícios das teorias pedagógicas que se instalaram e tomaram conta das escolas superiores de educação teve o grande mérito em lançar uma pedrada no charco da deficiente formação científica e cultural da juventude do ensino básico. Desconhecer ou duvidar disto é cometer uma tremenda injustiça para com estes professores universitáriostykkms a quem a educação não superior muito deve! universitário

Carlos Fiolhais disse...

Caro Carlos Pires:
Não tenho mesmo tempo para responder a tudo, mas vou lendo e retendo o que importa...
Não há nenhuma contradição minha. Referi o conteúdo do recente relatório americano, que pode ser lido na Internet (há um link num post anterior no DRN), e citei Kevin Miller, com quem falei em Coimbra,que não fazia parte dos autores e que não tem de ter opiniões coincidentes. Os leitores interessados saberão tirar as suas conclusões. O importante é que estas questões sejam debatidas também entre nós.

Cordialmente
CF

Carlos Pires disse...

Quando sugeri que o Carlos Fiolhais devia dizer algo mais, não tinha em mente uma resposta defensiva e um pouco enfastiada, uma mera defesa da sua dama, mas uma participação no debate que o seu post tinha desencadeado.
Quanto a não haver nenhuma contradição da sua parte: no primeiro comentário g. mbeki apontou-a; e eu, no segundo comentário, tentei mostrar que não havia realmente contradição.
Cordialmente.

Carlos Pires

CA disse...

Sugiro que se aplique apenas 5% do espírito crítico usado aqui em relação à religião para avaliar o livro do Nuno Crato sobre o eduquês e a responsabilização do eduquês pelo que se passa no nosso ensino.

Em certos meios é politicamente correcto atacar o eduquês ainda que se entre nas contradições que o mbeki apontou aqui no primeiro comentário.

Os "anti-eduqueses" são tão demagogos como os piores "eduqueses".

Anónimo disse...

Ca,

Faço minhas as suas palavras!

Em diversos assuntos, é norma aqui no DRN ter-se uma visão puramente dualista: preto e branco; criacionista e "ateo-neodarwinista-fundamentalista"; "eduquês" e anti-eduquês"; "ignorantes" e "intelectuais-alinhados-com-os-dogmas-instalados"; "incultos" e "iluminados"; "bons" e "maus".

Onde é que eu já ouvio este discurso?

A esta visão escapa tudo o resto que está entre os extremos...


JD

Anónimo disse...

Anónimo/a

Eu escrevi isto:

"Mas, mais uma vez, foquemo-nos no essencial: ensinar os alunos de acordo com a dimensão das turmas e a extensão dos programas. E isso, no eduquês, no tradicional~es, no Nuno Cratez em Portugal, é uma coisa que tem que ser arrepiada e pensada de forma prática e objectiva. ".


Significa o mesmo que:
"A esta visão escapa tudo o resto que está entre os extremos...". Provavelmente, significa mais ainda: operacionalizar.

Eu também li o livro do Nuno Crato. Mas não precisava de o ter lido. Andava atenta aos artigos no Expresso e a outras ocorrências na Internet, por exemplo. E, por acaso, andava nas lides académicas.

Se há uma coisa que eu não tenho é dogmas e, mais uma vez, tenho que concordar com o Carlos Pires: dogmas para mim só há 2: são os meus filhos. Como já fui a Florença, ... :).

E mais, detesto posições cerradas e pessoas que marram sempre para o mesmo lado, desculpem-me a expressão. O relativismo absoluto também não pode ser. Portanto, e se calhar o apelo é à Academia das Ciências da Educação, metam pés ao caminho, encontrem um país parecido com o nosso, em que os catraios tenham boas performances nas matemáticas e nas ciências e afiram o que houver para aferir.

É que isto de se ser um povo intelectualmente evoluído, com preocupações ligeiramente acima das da sobrevivência e de conseguir ter um carro e gasolina para andar nele, não é coisa que se faça por decreto..


O que eu acho é que se calhar temos que tratar estas questões agora como se fossem uma garrafa de um vinho tinto de que toda a gente diz bem, mas que ainda não se provou.
Deixa-lo repousar, abrir para respirar e consumi-lo depois, acompanhado de um belo prato com calma e gosto.

Avaliar depois a refeição completa.

Poderá ser uma metáfora toleirona, mas pretende dizer que as mensagens passaram e todos estamos a pensar nelas e a utiliza-las, a aferi-las, a estuda-las. É altura de deixar assentar e deixar que quem está no verdadeiro terreno tenha o tempo necessario e imprescindível de ver como lhe sabe o vinho.

Além do mais, eu sou uma cachopa que de modas, só se forem vestidos e sapatos. Até o vinho é de modas.:).

Anónimo disse...

Esqueci-me de uma coisa que acho importante passar.
Ao nível do 1º ciclo, na matemática, não sei como nem a que propósito, mas alguém convenceu as professoras ( e já bem experientes, e já bem entradotas) de que cálculo mental é igual a abstracção.
Eu explico: passei pelo 1º ciclo e percebi que os miúdos tinham que, perante um problema qualquer, básico, simples, de puro cálculo mental que fosse, idealizá-lo todo nas suas cabecitas e avançar com uma resposta. Logo que o aluno mais matemático resolvia a questão, a respsota era escrita no quadro, a contita feita e o problema estava resolvido. Quem não percebesse, só tinha que olhar para a expressão numérica que o resolve e percebe-lo. Coitados dos que não chegavam lá.
Ora isto continuava à medida que a complexidade do problema aumentava, ie, qualquer problema se resumia à expressão numérica ou expressões que o resolviam. E á sacrossanta resposta, claro..
Visualização da situação, exploração da propria linguagem no problema, contextualização, comunicação matemática, desenhar o problema, fazer um esquemazito, isso tudo, e isto é um alerta, não estava a ser feito até há 2 anos no 1º ciclo.
Mais, a criançada tinha o péssimo hábito de apagar ter dois cadernos: Num, escreviam o enunciado. No outro, faziam "as contas". E depois voltavam ao 1º para responder a resposta...
Os problemas passavam assim a ser um enunciado com uma resposta. Pimba! Aliás, há imensos manuais de matemática no 1º ciclo que levam esta tendência à conta da horrível ideia de não se poder escrever nos livros!
E por isso, os miúdos têm o péssimo hábito de apagarem todos os cálculos e ideias que usam quando resolvem um problema e de só deixarem a resposta..Para ficar bonito...

Anónimo disse...

Peço desculpa pela péssima construção do texto do comentário anterior. Peço desculpa pela forma pouco cuidada como foi escrito, não pelo conteúdo.:)

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