terça-feira, 18 de setembro de 2007

Células de combustível em dispositivos móveis

Uma célula de combustível é uma célula electroquímica, pilha ou bateria como as outras, simplesmente a reacção química global que assegura a produção de electricidade é uma reacção de combustão, isto é, uma reacção com oxigénio que produz água - e dióxido de carbono se o combustível for um composto de carbono. Como em todas as pilhas, há conversão directa de energia química em energia eléctrica, sem passos intermédios nem perdas de energia, excepto, claro, as ditadas pela termodinâmica da reacção.

A reacção química em causa é uma reacção redox, isto é, uma reacção em que há transferência de electrões e uma espécie se oxida (perde electrões) e outra se reduz (ganha electrões). As reacções redox são reacções comuns, por exemplo quando usamos lixívia ou água oxigenada (a «lixívia» delicada é uma solução de água oxigenada ou peróxido de hidrogénio) para tirar nódoas estamos a tentar oxidar o lixo corado de forma a que este não absorva no visível e não o vejamos. Nesta «limpeza» de nódoas, os electrões são transferidos directamente entre as espécies químicas envolvidas. Numa pilha, «obrigamos» a transferência de electrões a dar-se à superfície de eléctrodos ligados a um circuito externo alimentando, por exemplo, um telemóvel. No esquema seguinte é representada uma pilha de combustível em que o combustível é hidrogénio, em meio ácido.
O eléctrodo negativo (de menor potencial) ou ânodo é o eléctrodo à superfície do qual se dá a reacção de oxidação que liberta electrões, que circulam acendendo a lâmpada e são consumidos à superfície do eléctrodo positivo ou cátodo onde se dá a reacção de redução, neste caso a redução de oxigénio. As reacções envolvidas são as seguintes:

reacção catódica (redução) O2+ 4H+ + 4e- ⇒ 2H2O
reacção anódica (oxidação) ( H2 ⇒ 2H++ 2e- ) x2

reacção global O2 + 2H2 ⇒ 2 H2O

Numa era em que os dispositivos móveis fazem parte indispensável do nosso quotidiano, o seu desenvolvimento, nomeadamente a utilização de processadores mais potentes, melhores écrans e a introdução de mais funções, estava dependente da capacidade e autonomia das baterias disponíveis. E digo estava porque os últimos dias têm sido fertéis em anúncios que alterarão o cenário actual.

A Samsung há muito que anuncia o seu interesse em equipar os dispositivos móveis que vende com células de combustíveis, nomeadamente computadores portáteis, PDA's e telemóveis. A semana passada o gigante sul-coreano anunciou que lançará, muito provavelmente ainda em 2007, um portátil, o Sense Q35, alimentado por uma célula de combustível com uma autonomia assombrosa: podemos utilizá-lo oito horas por dia, cinco dias por semana durante um mês sem recarga.

Uma empresa norte-americana, a Medis, antecipou-se no entanto à Samsung e a sua página anuncia já a primeira célula de combustível comercial, o Medis 24/7 Power Pack que servirá para carregar baterias convencionais de telemóveis, ipods e dispositivos similares. Os progressos do «primo» mais potente do 24/7, que se destina a recarregar portáteis, serão apresentados no Intel Developer Forum, que começou hoje em São Francisco.

Embora quando se fala em células de combustível se pense imediatamente em pilhas de hidrogénio como a representada, na realidade pode-se usar qualquer combustível e a Samsung escolheu o metanol na sua Direct Methanol Fuel Cell. A Medis optou por hidrogénio produzido in situ a partir de um sal de borohidreto (BH4-) - não consegui descobrir qual, talvez borohidreto de sódio como utiliza a Millenium Cell.

A vantagem das pilhas de combustível em relação às restantes são óbvias: apresentam autonomia e vida útil (desde que seja fornecido o combustível e oxigénio ou ar) muito superior a todas as tecnologias de baterias actualmente disponíveis.

O Brasil será já nos dias 24, 25 e 26 do corrente mês o anfitrião de um evento, o Brasil H2 Fuel Cell Expo/Seminar 2007, em que universitários e investigadores de empresas como a General Motors ou a BASF Fuel Cells, discutirão temas relacionados com a produção, armazenamento, distribuição, tecnologia e aplicações das pilhas de hidrogénio! Como os anúncios da Samsung e da Medis indicam, a energia do futuro está a chegar!

7 comentários:

Anónimo disse...

Prezada Palmira:
Como eu admiro a sua forma de explicar as coisas mais complexas de uma maneira simples.Para além de admiração, confesso-o tenho uma enorme inveja. Uma saudável inveja!

E assim nos vai mantendo a par de novidades científicas com aplicação tecnológica à mão de semear: quem não deseja uma pilha de hidrogénio muito mais durável que a Duracell (será assim que se escreve?) que dura, dura...dura!

JSA disse...

É sempre bom realmente lembrar que as células de metanol são aquelas que estão actualmente a ser mais utilizadas. O hidrogénio é realmente o "santo graal" desta tecnologia, mas a situação está ainda muito incipiente devido a diversas limitações. O metanol, por seu lado, vai de vento em popa nesta tecnologia, sendo apenas necessário resolver os problemas de segurança (sempre é um material inflamável) e os do transporte de protões pelo electrólito (quase sempre uma membrana, local onde está a maior limitação da tecnologia).

Obrigado Palmira pela chamada de atenção para estes produtos, os quais poderão mudar, em muito, o consumo de energia no futuro.

Anónimo disse...

"A semana passada o gigante norte-coreano anunciou "...

O gigante SUL-coreano, como é óbvio.


Bom texto.

Cumpts

Palmira F. da Silva disse...

OOps:

Obrigado caro anónimo, esta gralha de facto é imperdoável :-)

Anónimo disse...

Mas está bem escrito - "sul coreano", não há gralha nenhuma.

Palavra Alada disse...

o metanol faz também parte da composição dos quimicos para revelar fotografia?

Palmira F. da Silva disse...

Caro(a) Palavra Alada:

Tanto quanto saiba a única utilização de metanol em fotografia é a limpeza de lentes e outro material óptico.

Pode ser que algum leitor menos ignorante de fotografia que eu conheça outra utilização mas pelo menos as receitas que preparei a pedido de alguns amigos apaixonados por fotografia mas sem conhecimentos de química eram todas de soluções aquosas sem metanol na composição.

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