sábado, 7 de abril de 2007

Neo-criacionismo ou IDiotia

A Igreja do Monstro do Esparguete Voador, um fenómeno de culto, diria mais uma religião de massas, surgiu como resposta satírica à IDiotia.

O post do Carlos confirma serem as investidas dos fundamentalistas reconhecidas em Itália como uma guerra à ciência que convém desmontar (podem ver aqui a apresentação do livro na Casa da Cultura de Milão). Antes de continuar a análise dos dislates criacionistas puros e duros, um pequeno parêntesis para explicar que o desenho inteligente ou IDiotia (Intelligent Design, ID) é simplesmente uma nova forma de introduzir o criacionismo bíblico nas salas de aulas de ciência, não obstante o cuidado que os IDiotas têm em não referir Deus, apenas um misterioso «designer», e em expurgar qualquer citação bíblica dos seus textos.

E são de facto neo-criacionistas como é evidente se considerarmos que o único livro de texto da IDiotia recomendado como «leitura suplementar» nas escolas americanas, «Of Pandas and People», é apenas uma versão revista do criacionismo puro e duro, em que Deus foi substituído pelo tal misterioso «designer» e foram cortadas as passagens bíblicas originais.

Embora o livro seja supostamente publicado por uma obscura editora, a «Haughton Publishing Company», ou a «Horticultural Printers, Inc.» - que imprime livros de instruções de maquinaria para a indústria do algodão, rótulos e catálogos de produtos para horticultura -, na realidade, os Pandas são um livro da «Foundation for Thought and Ethics», uma organização devotada a promover o criacionismo.

O templo dos neo-criacionistas disfarçados de IDiotas é o Discovery Institute, DI, uma instituição sem problemas de financiamento que exibe como grande trunfo uma lista com cerca de 400 cientistas, na sua maioria ligados ao próprio Instituto. Teológos Cientistas que, segundo o DI, apresentam grandes dúvidas em relação ao evolucionismo. Bem, desde há uns tempos menos um, já que um dos mais proeminentes listados, Bob Davidson, professor de Medicina na Universidade de Washington, fez uma retractação pública da sua ligação ao DI. Afirmando estar embaraçado por alguma vez se ter ligado ao DI e ter ficado chocado quando viu que o DI afirma que a evolução é «uma teoria em crise». Afirmação que Davidson considera «Hilariante: foram realizadas milhões de experiências ao longo de mais de um século que suportam a evolução».

Quando se fala em IDiotia fala-se inevitavelmente nas bacoradas publicadas (em livro e em editoras não científicas, claro) por Phillip Johnson, William Dembski, Michael Behe e Stephen Meyer. Bacoradas que obviamente não são aceites por quem de direito, a comunidade científica, porque são apenas isso, bacoradas. Não há uma única hipótese IDiota - tirando a teoria dos anjos, claro -, um único modelo, que possa ser falsificável ou investigado de forma científica. Só há um afirmar inconsubstanciado de que tem de existir um «criador».

Isto é, como Philip Jonhson, o jurista autor do livro «Darwin on Trial», um dos «pais» da IDiotia e o seu porta-voz não oficial, deixou muito claro numa entrevista, o objectivo da IDiotia é vender o criacionismo (mal)disfarçado de «teoria» científica.

Como o próprio afirmou, a polémica em relação à evolução «Não é de facto, nem nunca foi, um debate sobre ciência. Apenas sobre religião e filosofia». Na realidade, Jonhson considera que «Ser um cientista não é necessariamente uma vantagem, quando lidamos com um tópico tão abrangente como a evolução, que se entrelaça com muitas disciplinas científicas e também envolve os toques da filosofia», ou seja, considera que um juiz será, também necessariamente, mais capacitado para opinar (negativamente) sobre evolução que um cientista!

William Dembski, matemático, autor de «Intelligent Design: The Bridge between Science and Theology» (Desenho Inteligente: A Ponte entre a Ciência e a Teologia), afirma que «a solidez conceptual de uma teoria científica não pode sustentar-se distanciada de Cristo» o que ilustra a motivação (e solidez) das suas teses.

Outro dos nomes sonantes dos IDiotas é Michael Behe, autor do livro «A caixa preta de Darwin», professor de Bioquímica no Departmento de Ciências Biológicas da Universidade de Lehigh. Posição IDiota não subscrita por qualquer colega e reiterado numa página institucional devotada a explicar que a posição de Behe não é seguida por mais algum membro do corpo docente da instituição. A posição colectiva do Departamento em relação ao desenho inteligente é a habitual para qualquer cientista digno do nome: não tem qualquer base em ciência e não deve ser considerado algo científico.

De facto, a comunidade científica em peso considera a IDiotia apenas uma forma disfarçada de intoduzir religião nas aulas de ciência, sem qualquer resquício de ciência a contaminar o que é demagogia religiosa pura e dura. Como o afirmam nas respectivas páginas a maioria das sociedades e instituições científicas americanas, por exemplo a Sociedade Botânica, a Sociedade Geológica, a Sociedade Paleontológica e a American Association for the Advancement of Science, que publica a revista Science.

Há mais de 5 anos foi publicado um artigo que se mantém actual - já que o criacionismo não evolui - respondendo às IDiotias que, supostamente, encontram «problemas graves» na teoria da evolução: 15 respostas ao nonsense criacionista, um artigo de 2002 na Scientific American do seu editor-chefe, John Rennie.

Não há qualquer mérito num pseudo-debate evolucionismo-criacionismo (em qualquer das suas versões) muito menos existe mérito em debater o ensino paralelo do evolucionismo e da IDiotia em aulas de ciência. A IDiotia simplesmente não é ciência! Dados o populismo, demagogia e desonestidade intelectual de todos os criacionismos urge apenas desmascarar os respectivos dislates.

9 comentários:

Joana disse...

Excelente! E muito esclarecedor!

Não sei se a Palmira já reparou mas os textos do Jónatas Machado são uma salganhada sem pés nem cabeça de criacionismo puro e duro, CRAP e IDiotia.

O fanático evangélico é tão ignorante que não percebe que os argumentos que usa são mutuamente exclusivos. É de morrer a rir ele usar coisas do CRAP e depois vir com tretas de alteração das constantes físicas por obra e graça do Espírito Santo. Ou usar tretas da IDiotia que contradizem a patetada mor da Terra jovem.

Um fartote!

Anónimo disse...

Desconhecia a dimensão «global» do FSM, só tinha dado com isso aqui, no sítio da Science Creative Quarterly. Mas que faz tanta lógica como a «realidade» parodiada, lá isso...

Ricardo

Palmira F. da Silva disse...

Olá Ricardo:

Muito obrigado pelo link :-)

Vou usá-lo no texto, é simplesmente demolidor!

Palmira F. da Silva disse...

Olá Joana:

Os textos do Jónatas Machado são um arrazoado tão grande de disparates que me passou despercebido esse facto. Mas não me espanta. Obrigadissimo pela informação preciosa.

Anónimo disse...

O FSM é a cara da IDiotia e tem o mesmo crédito que as IDiotices merecem.

Os artigos do Science Creative Quarterly são um must read.

Filipe Brás Almeida disse...

Excelente post.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Adorei o blog de vocês. Muito obrigado pela iniciativa. Estou cansado de ver a idiotia passar impune... Agradeço de coração!

Anónimo disse...

“Como já disse muita vez noutros lados, o homem sapiens já existe há mais de 300.000 anos, e antes dele havia hominídeos, que já vêm de milhões de anos atrás. O Deus dos Israelitas, chamado Geová ou Javé ou até mesmo Eloim, antecessor do deus dos cristãos, só começou a ser falado ou foi criado (ou inventado) há cerca de 3.000 anos. Apesar do mito ter nascido oralmente no período Neolítico.”
E nos outros 200 e tal mil anos onde estava Deus escondido? Em lado nenhum porque ainda não tinha sido inventado.
Repare, estamos a falar de mais de 200.000 anos, (só contando com o Homo Sapiens) sem que se falasse de Deus. Quem arranjou esta ideia de Deus, não foram os homens? Claro que sim. Por isso, não passa de um ser imaginário, como tantos outros: ANJOS e toda a hierarquia Serafins, Querubins, etc., DIABO E OUTRAS NOMES DERIVADOS, SATANÁS, e outros.
Por isso estou convencido de que deus não existe.
Aliás, quem estudar o início das religiões e como tudo começou, sabe perfeitamente do que falo.“

O criacionismo, em qualquer das suas vertentes, é uma grande treta.

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...